quarta-feira, 30 de agosto de 2017

O COSTUME IORUBA DE CULTUAR ORIXÁS NO VULTO

Por Erick Wolff de Oxalá
Agosto/2017

Este artigo traz algumas fotos sobre o vulto na tradição de orixá, nas quais poderemos ver diversas divindades representadas por vultos de madeira, podendo medir até mais de um metro de altura, conforme os costumes da região, vejam as fotos;

É muito comum o orixá Bara (Exu) sento em vultos; nesta imagem podemos ver dois vultos de Bara ainda contendo resquícios de uma oferenda.


créditos imagem: Esu Alaje by Elegun  Akinwale

Aqui podemos ver o vulto de Yemanja, junto com seus pertences sagrados ao redor, alguns utensílios até comuns entre os templos do Batuque.


Créditos da imagem: Iyemoja Ojubo Ibadan 1983 foto Osvaldo Omobatala

Nesta imagem, observem as louças e o vulto neste Ojubo de Obatala.

Créditos da imagem: Obatala Osogbo (Ifaleke Ajala)


Créditos da imagem: Obalufon Shrine, Ile Ife, 2006 
(Instituto Ekun)

Créditos da imagem: Osun (awo imule)


Créditos da imagem: Obatala_isara-remo_foto-ejire-olorisa


Observem neste vídeo os vultos;





Sinopse: Babalaw Awe é um curandeiro / fetiche que vive na fronteira entre Nigéria e Benim. Desde sua pequena empresa de consultoria, ele recebe todos os domingos, uma multidão de pacientes vem por problemas tão variados como doenças, questões sobre o futuro ou mesmo problemas existenciais. O homem trabalha de acordo com uma concepção própria, uma vez que ele cobra suas consultas com o resultado. No entanto, para consultá-lo, é preciso ganhar sua confiança e a de seus fetiches (tradutor online)



VULTOS E OKUTAS NA TRADIÇÃO DO BATUQUE

Na tradição do Batuque do RS, os sacerdotes costumam usar pedras chamadas de okutá (abreviando por otá), ou vultos, estes que representam determinadas divindades;

- Okuta: Uma pedra com formato determinado conforme a divindade a qual será senta, o local que deverão buscar esta pedra varia entre rios, caminhos, encruzilhadas, pedreiras ou campos.

- Vulto: vultos esculpidos em madeira, ferro ou pedra, são muito usados para determinadas divindades. Estes vultos em alguns casos são vestidos.

Estes Okuta ou vultos ficam em vasilhas de barro, louça ou ferro, podendo variar conforme o fundamento da divindade. Ainda encontraremos assentamentos de orixá dentro cabaças, cascas, cascos de alguns animais, ou potes de cerâmicas ou barro.  No interior destas vasilhas sempre acompanham ferramentas, búzios e fundamentos que pertencem àquela divindade, que não devem ser vistos por qualquer um expondo os seus segredos de feitura.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tanto os Vultos e Okutas são costumes que vieram da matriz para a diáspora através dos nossos ancestrais, assim como no vídeo pudermos ver os vultos na curandeira do sacerdote que vive na fronteira do Benin com a Nigéria. Saber o que cultuamos para sabermos quem somos. 

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

MITOS DA ESCRAVIDÃO EM MINAS SÃO DERRUBADOS POR PESQUISADOR

Por Gustavo Werneck

Agosto/2017


Estudioso derruba imagem de que os negros eram sempre os humilhados e revela: em Minas, mais de 30% deles tinham posses, eram proprietários de terras e até de outros escravos

Nas novelas de tv, ambientadas nos tempos da escravidão, os negros têm destino certo: quando não ficam amarrados no tronco apanhando feito cachorro, estão presos aos grilhões nas senzalas ou preparando quitutes na cozinha da fazenda. Já na literatura do século 19, comem o pão que o diabo amassou – se é que havia pão! – no porão das embarcações, encarando “tanto horror perante os céus” – como escreveu o baiano Castro Alves (1847-1871) no poema Navio Negreiro. Ganhou força, então, no imaginário popular, a imagem de homens e mulheres humilhados, vítimas de olhos baixos e impotentes para levantar a voz contra o seu senhor. Mas novos estudos mostram que a trajetória dos escravos africanos no Brasil tem muitos mitos e que eles foram, sim, agentes da história e nem sempre submissos.

Estudioso de tema tão polêmico há mais de 20 anos e autor de vários livros, o professor de história da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Eduardo França Paiva conta que os escravos desenvolveram autonomia e até ajuizaram ações contra os seus proprietários, quando se sentiam lesados. Muitas vezes levaram a melhor no tribunal, ao defender, por exemplo, que já haviam pago todas as parcelas de compra de sua liberdade, algo que o senhor contestava. “O equívoco maior é pensar que os cativos foram vítimas o tempo todo. O 13 de maio de 1888, lembrado amanhã, data em que a Princesa Isabel (1847-1871) assinou a Lei Áurea e extinguiu a escravidão no Brasil, serve para discutir o assunto e corrigir uma série de distorções, muitas delas construídas pelos abolicionistas”, diz o professor, que segue na próxima semana para Sevilha, Espanha, onde fará o segundo pós-doutorado, desta vez sobre as Américas portuguesa e espanhola. 

Nas suas pesquisas, o professor Eduardo, que atua nas áreas da história da escravidão e das mestiçagens, vem fazendo descobertas surpreendentes. Uma das mais importantes se refere aos senhores de escravos que, ao contrário do que se aprende na escola e nos livros didáticos, nem sempre eram brancos. Em Minas, do início do século 18 a meados do 19, mais de 30% desses proprietários eram ex-escravos ou descendentes de escravos. Em 1776, conforme as estimativas, havia na capitania de Minas, então a mais rica e populosa da colônia, com um comércio conectado com o mundo e efervescência social e cultural, cerca de 300 mil habitantes, sendo 130 mil forros (ex-escravos), 110 mil escravos e 60 mil brancos. 

“Havia em Minas mais ex-escravos do que escravos, a maior parte mulheres”, afirma o professor, explicando que somente a partir da segunda metade do século 19, a escravidão passou a ser condenada. “Até então, era legal e legítima, e os cativos prezavam dois valores fundamentais: queriam ser livres e proprietários de escravos. Os castigos físicos eram comuns nesses tempos de patriarcado, em que os pais batiam muito nos filhos”, diz o autor de vários livros, entre eles Escravidão e universo cultural na colônia, editado pela UFMG, e Escravos e libertos nas Minas Gerais do século 18, da coleção Olhares/UFMG/Annablume. 

Fortuna

Entre as personagens mais importantes encontradas nas pesquisas está Bárbara Aleluia –negra filha de africanos, nascida no Brasil –, uma pernambucana que viveu em Sabará. “Ela foi uma das mulheres mais ricas da época, acumulou fortuna com o comércio e outras atividades”, revela. Pinturas ainda desconhecidas da maioria dos brasileiros mostram negras cobertas de joias e usando trajes típicos, a exemplo das mulheres africanas, ou andando pelas ruas com seu séquito. Num livro, Eduardo mostra o retrato de uma baiana, uma negra enriquecida, que posa em estúdio com seus colares de ouro. 
Em Minas, com uma sociedade mais urbana, a situação era bem diferente da encontrada ao Norte da América Portuguesa. “Aqui havia muitos senhores de poucos escravos, em média cinco para cada um, bem diferente de Pernambuco e Bahia, com 30 por um. Outro diferencial mineiro é que nem todos os proprietários eram ricos”, diz o professor, explicando que, por volta de 1730, a mineração de ouro já estava em decadência, embora a economia se mantivesse forte e dinâmica, com um comércio influente e produção agrícola em ascensão. Esse quadro favorecia a compra da liberdade. 

Para conseguir o seu objetivo, o cativo tinha que ser, antes de mais nada, um bom negociador, o que significava um acordo com o seu dono sobre a forma de pagamento. Quem não ganhava a alforria em testamento ou na pia batismal, podia pagá-la parceladamente, num período de quatro a cinco anos, em prestações semestrais, num sistema denominado coartação –nesse tempo, o chamado coartado ficava longe do domínio cotidiano de seu proprietário. Outra forma de ficar livre era pagando à vista. “O dinheiro para saldar o débito era obtido de diversas formas. As mulheres dominavam o pequeno comércio, vendendo, nas ruas, doces, sucos, carnes e outros produtos. Eram muito comuns, nessa época, as ‘negras de tabuleiro’, que, como mostram também gravuras antigas, saíam pelas vilas e arraiais vendendo comidas. A prostituição era outro caminho para alcançar a liberdade”, conta. O artista italiano Carlos Julião (1740-1811) pintou aquarelas retratando a vida dos recém-chegados da África – e chamados de boçais por não saberem falar a língua portuguesa – e dos enriquecidos.

Um dos objetivos do professor é tirar dos escravos e forros o perfil exclusivo de vítimas e dar-lhes a dignidade de quem construiu sua liberdade e ajudou na edificação do país. “No Brasil, o cenário de escravos amarrados ao tronco, sendo chicoteados, é fortemente panfletário, embora o castigo físico tenha existido em toda a colônia. Enquanto os escravos foram efetivamente agentes da história, a historiografia brasileira contemporânea continua repetindo discursos abolicionistas, o que significa exagerar no grau de violência praticado pelos senhores”, diz o professor, convicto da necessidade de maior aprofundamento das pesquisas.

Primeiras leis

Para quem pensa que todo negro na colônia era escravo, o professor esclarece que nem todo escravo era negro”. Mulatos, pardos e cabras (descendentes de negros e índios também eram escravos. E por que essa diferença? Eduardo conta que, no século 18, os “negros de corte”, a exemplo de alguns nobres do reino do Congo, iam estudar em Lisboa, Portugal, ou Salvador, na Bahia. Igualmente livres eram também alguns africanos que trabalhavam nos chamados navios negreiros que cruzavam o Oceano Atlântico. Em 1830, surgem as primeiras leis que proibiam o tráfico de negros determinando que todo africano que pusesse os pés no território brasileiro deveria ser considerado livre. 

“O equívoco maior é pensar que os cativos foram vítimas o tempo todo. O 13 de maio serve para discutir o assunto e corrigir uma série de distorções, muitas delas construídas pelos abolicionistas”Eduardo França Paiva, professor de história da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) 

Linha do tempo
Século 16 – Começa a escravidão no Brasil e os índios são os primeiros a trabalhar nesse sistema. Os negros africanos chegam à colônia na segunda metade do século
Século 18 – O sistema começa em Minas, sendo escravos os negros, mulatos, pardos e cabras (filhos de negros com índios) 
1830 – Entram em vigor as primeiras leis proibindo o tráfico atlântico de escravos. Todo africano que chegasse ao território brasileiro deveria ser considerado livre 
1850 – Em 4 de setembro, é aprovada a Lei Eusébio de Queirós, que põe fim ao tráfico negreiro
1871 – Em 28 de setembro, é promulgada a Lei do Ventre Livre, que considerava livres todos os filhos de escravas nascidos a partir daquela data
1885 – Em 28 de setembro, é promulgada a Lei dos Sexagenários ou Lei Saraiva-Cotegipe, que garantia liberdade aos escravos com mais de 60 anos
1882 e 1885 – Em Minas, são criadas a Sociedade Abolicionista de Ouro Preto e a Beneficente Associação Marianense Redentora dos Cativos, que promoviam a emancipação dos escravos _
1888 – Em 13 de maio, a Princesa Isabel sanciona a Lei Áurea, que extingue a escravidão no Brasil





Arturos em festa

A tradicional comunidade dos Arturos, de Contagem, na Grande BH, celebra neste fim de semana a Festa da Abolição. Hoje, às 18h, tem concentração das guardas de Congo e Moçambique, na Rua da Capelinha, 50, no Bairro Jardim Vera Cruz. Às 18h30, haverá cortejo das guardas em direção à Matriz de Nossa Senhora do Rosário, no Bairro Alvorada, seguindo-se celebração eucarística (19h30) e levantamento de mastros na Casa da Cultura/Museu Histórico, na matriz e na comunidade (20h30). Amanhã, a programação começa às 4h, com a Festa da Matina ou Dança que chama o sol , na Rua Capelinha, 50, e segue até as 22h com desfiles, missas, encenações e celebrações. A comunidade negra Arturos descende de Camilo Silvério da Silva, que, em meados do século 19, chegou ao Brasil num navio negreiro vindo de Angola. Em Minas, trabalhou num povoado na Mata do Macuco, antigo município de Santa Quitéria, hoje Esmeraldas. 

(Fonte - http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2012/05/12/interna_gerais,293896/mitos-da-escravidao-em-minas-sao-derrubados-por-pesquisador.shtml)

terça-feira, 15 de agosto de 2017

O CULTO AOS MORTOS NO BATUQUE NÃO É (E NÃO PRECISA SER) UM CULTO DE EGÚNGÚN.

Erick Wolff de Oxalá
Agosto de 2017
Revisado e aumentado em 26/03/2021


“De modo algum o ilé-ibo-akú (ibokú)*, a casa do culto aos mortos do lésè òrìsà (casa de orixá), deve ser confundida com o lèsànyìn, a casa do culto de egúngún dos lésè egúngún (terreiro de eégún).

No ibokú são cultuados os espíritos dos iniciados, sacerdotes (tisas) iniciados no culto dos òrìsà.

No lésànyin são cultuados os ará-òrun em geral, e os espíritos daqueles que foram iniciados no mistério dos egúngún”

Juana Elbein dos Santos & Deoscóredes M. dos Santos,
“O Culto dos Ancestrais da Bahia, o culto dos eégún”,
Tradução de Carlos Eugênio Marcondes de Moura

In: Olóòrìsà, escritos sobre a religião dos orixás,
 (Org.) Carlos Eugênio Marcondes de Moura,
Ed. Ágora, 1981, p. 171.


No texto de chamada deste pequeno artigo, Juana Elbein e seu esposo, Mestre Didi, esclarecem que existe uma diferença entre o ibo, local de culto aos mortos da tradição do terreiro de orixá, e o lèsànyìn, local de culto de baba egun.

Em ioruba, osso se escreve egungun, e o espírito cultuado através deste osso chama-se egúngún (nome).

O culto de baba egun no ilèsànyin, do terreiro de egúngún nada tem a ver com o culto dos ancestrais religiosos no balé (ibóku) de uma casa de orixá. O que se faz no balé (ibóku) do Batuque não tem nada a ver com o que se faz no lèsànyìn do culto de baba egun.

No Batuque do RS, no balé (ibo) se cultua os espíritos dos mortos, babalorixás e ialorixás fundadores (as) das tradições do batuque, e ancestrais das famílias religiosas, mas não existe no Batuque o osso deste ancestral ali presente, naquele chão.

Tem-se notícia que alguns sacerdotes (?) tem o costume de pegar ossos em cemitérios para montar um balé, mas isto, além de estar completamente errado, ainda é crime previsto em lei. Tal prática nada tem a ver com o culto tradicional do ancestral no Batuque e deve ser completamente abolida.

No Batuque, o culto é feito à memória dos nossos ancestrais religiosos, mas os ossos destes ancestrais não estão enterrados ali, por isso, não precisamos de ojé, por que não estamos fazendo culto de baba egun. O local de adoração aos mortos, no batuque, pode ser feito num buraco no mato, ou caso tenha espaço, no pátio do templo; podem destinar um pequeno local para adoração, que o Batuque chama de balé (ibokú), local de culto aos mortos.

Quando cultuamos a memória do morto, nossos ancestrais, criamos um elo entre a comunidade e os mortos através do balé (iboku); desta forma, os descendentes que possuem casa aberta e todos os axés, podem ter um balé (ibóku) em seus templos tão logo seja possível, para que os ancestrais possam abençoar, proteger e orientar aquela comunidade.

Todos os lados do batuque (Jeje, Ijesa, Kambina e Oyo) possuem rituais e fundamentos de egun, no entanto, Kambina é a que mais e destaca pela sua peculiar familiaridade com Xangô Kamuka e os rituais dos mortos da comunidade.

Assim, os rituais fúnebres do Batuque do RS são ministrados pelos babalorixas e iyalorixas, prontos de todos os axés, e inclusive, possuem fundamentos e segredos dos rituais fúnebres, para atuarem dentro do balé (ibóku) da casa de orixá. Não é necessário a presença de um ojé, pois este rito fúnebre do Batuque nada tem a ver com o que se pratica no lèsànyìn (léssanin) do culto de baba egun, pois nos terreiros de Orixá, como o culto é para memória dos mortos, não precisa do osso; bastam-se os paramentos ou utensílios que o representem. Por isso, repetimos, ojé é desnecessário. Um sacerdote que faleceu, não se torna Baba Egun simplesmente pelo fato do seu cargo de Baba, sendo um equivoco afirmar que o  Baba falecido no Batuque é um Baba Egun.

O nome do ritual fúnebre do batuque chama-se orissun ou, arissun ou, sirrum. Assim que o individuo falece, iniciam os rituais com corpo presente. Prepara-se a pessoa, o caixão, fazem rituais sobre ele, inclusive dançam em volta e depois levam este caixão embalando ao som de cantigas fúnebres. Após isso, os rituais levam sete dias, no ultimo despacha todo o carrego, e guarda o luto que poderá chegar a um ano.

Aos sacerdotes que possuem balé (ibóku), anualmente costumam fazer uma festa para os mortos, com muita comida e rituais. Antigamente os mais velhos chamavam de missa de Egun. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como informamos acima, o culto aos ancestrais iniciadores do Batuque do RS são de exclusividade dos sacerdotes de orixá, e o culto da memória do falecido não necessita do osso, e não faz nenhum sentido pegar ossos em cemitérios de cadáveres desconhecidos, para cultuar como ancestral.

Assim os sacerdotes do Batuque que sabem como praticar seus rituais aos mortos desta comunidade, não necessitam de um ojé, sacerdote de outra religião, que é o culto de baba egun, e nem cometerem o crime de buscarem ossos em cemitérios.

Para finalizar, tenham em mente que cultuar um ancestral religioso no balé (ibóku) de uma casa de orixá, não tem nenhuma relação com o culto de baba egun no terreiro de egúngún. Misturar os dois cultos é se perder pelo caminho. 

*Diferente do que a autora informa "ilé-ibo-akú (ibokú)", os mortos em Ioruba é Òkú, por motivos de não podermos modificar a referencia, foi mantido o texto.

TIKTOK ERICK WOLFF