sexta-feira, 1 de maio de 2009

A NAÇÃO KABINDA-NAGÔ E OS COSTUMES YORUBÁ: semelhanças e tradições no Brasil

Foi por volta do começo do século XIX, que o aculturativo entre os Nàgó e os Jeje se fortificou, com a participação dos lideres religiosos das duas culturas em movimento da resistência anti-escravatista.

Os candomblés ou Batuques eram no começo do século passado, centros de reunião dos Nàgó, com forte influência Islâmica, que aqui viviam como Jeje, Hauças, Gruncis, Tapa e os descendentes do Congo e Angola Costa.

Foi através da Iyáloriṣá Aninha que se firmou como primeiro terreiro Nagô na Bahia, fundado na pureza dos Nagô. Que apesar de assimilarem divindades Jeje (Vodoun) e Nàgó (oriṣá, orixás ou òrìṣà) a Iyáloriṣá deu inicio a uma nova vertente religiosa no Brasil. Em contra partida, se fundava no Sul do País, a nação chamada de Batuque, com quatro vertentes religiosas que tiveram inicio na mesma nesta mesma época e com estruturas religiosas semelhantes.

Duas teses tiveram como ascendente à vertente Kabinda-Nàgó do Rio Grande do Sul, por falta de conteúdo e ou registros históricos que atestem sua origem logo se imaginaria como sendo uma nação oriunda de Angola. Foi buscando a origem da Cabinda (Bantu), que nada mais é do que uma das 18 províncias da República de Angola, que percebi que existiam pontos importantes para se analisar e pesar. Porem mais tarde estudando a linhagem da palavra Kamuka ficou claro que segundo a cultura Bantu, esta palavra traduzida Kamuka refere-se a um ritual fúnebre, ou seja, um funeral. 

Até então poderíamos fazer a relação com o culto Kabinda do Batuque e seus rituais de passagem nos caminhos de Egun. Porem, para que realmente isso ocorresse, Kabinda deveria estar ligada ao culto dos ancestrais especificamente e não ao culto dos Oriṣá, deixando de lado o culto às divindades Yorubá e indo direto para o culto Bàbá-Ègún, novamente isso não seria possível, pois, cairíamos outra vez nos costumes e rituais Yorubá e não Bantu. 

Contudo, ao se deparar com a tradição Bantu não encontramos características que possam alimentar referida tese, sendo claro que Nzaze o Nkissi da justiça, o rei que traz abundância ao seu povo, porem, odeia Fu kia fuíla (morte), é aquele que desaparece do Abaçá (barracão) quando ela (Fu kia fuíla)  o ronda, pois, quando morre algum membro do Abaçá, o costume é suspender todos os atos, e se tiver algum Ìyáwó recolhido o mesmo permanece, porem as  obrigações são suspensas, parando tudo e prepara-se o Ntambi (Sirrum, Aṣeṣe, ETC.), que apenas ao termino dos rituais fúnebres é que se dará a Muzenza (saída do Yawó).

Quebrando assim a ligação do rei Kamuka da nação Kabinda-Nàgó com a cultura Bantu, a partir do momento que os rituais são diferentes dos costumes religiosos deste povo.

Veja o significado da palavra kamuka e o derivado kamukando
Kamuka: desfalecer, morrer. (dicionário kikongo)
Kamukando: funerais (dicionário kikongo)

Seguindo o preceito do ritual da nação Kabinda-Nàgó e seus vínculos com os ancestrais é que poderemos perceber bem como assimilar a justaposição com o povo Yorùbá.

Entre as várias pesquisas de estudiosos e adeptos da Kabinda–Nàgó, as mesmas sempre focaram a busca e o vinculo com o povo Bantu, porem nada que se pudesse atestar sua existência.  Assim se verificarmos o nome e qualidade da divindade em questão, poderemos notar a influência da língua Yorubá = Kamuka = Baruolofina (suponho que seja Baru Olofina), Aláààfin de Oyó.

Algo curioso, pois, dificilmente encontraremos entre os nomes das divindades o seu título, levando em consideração a dificuldade linguística e cultural do século XIX, o que ajudou a perder alguns itens como no caso do Rei da nação Batuque, raiz Kabinda-nàgó, que dificilmente será encontrado algo sobre esta divindade fora desta raiz Kabinda, e mesmo que assim o fosse, nada que possa atestar de concreto à sua origem Bantu, pela falta de registros que atestem a existência da divindade.

Seguindo a possibilidade deste Aláààfin partir de Oyó, pois suas características estão presentes no próprio culto, bem como na sua feitura, tendo sido assimilada pelo povo do batuque em seus rituais, onde surgem as quatro vertentes batuqueiros Jeje, Oyó, Kabinda e Ijexá.

As características deste Aláààfin poderão ser notadas na inversão do próprio nome para sua qualidade; v.g. Kamuka – Baruolofina / Baru olafin – Kamuka; apesar de ser apenas uma suposição, não deixa de ser uma clara ligação com o povo de Oyó, com o culto da nação Kabinda-Nagô ligado ao culto dos ancestrais.

Outro ponto a se analisar, é a confirmação do culto de Ègúngún dentro dos  rituais classificados pela Kabinda-Nàg', do batuque, sendo que ela é a única nação do Rio Grande do sul que antes de começar qualquer ritual de feitura, é costume reverenciar os antepassados, características exclusivas dos Kabindeiros, sendo este ritual tão diferente das demais vertentes religiosas afro-gauchas. 


 “A iniciação do Aláààfin
O novo Obá (rei) escolhido após fazer sacrifícios e banhos purificatórios, ficará recluso em um quarto provisório chamado Ipádi, recebendo instruções reais. A coroação do novo Aláààfin acontece 3 meses após a morte do antigo rei, na terceira lua nova, para ser mais exato. O ato da coroação ocorre em várias etapas durante vários dias.
Chegado o tempo, ele sairá do Ipádi e a sua primeira parada será em um local chamado abátá, em frente ao palácio real onde ele deverá trocar de roupas passando a usar roupas reais, sendo aclamado pelos súditos.
A segunda parada será na casa do Aláàpíni, o grão-sacerdote do culto dos  Egungun (ancestrais), que o reconhecerá como novo rei.
Em seguida, ele deverá visitar o Bàrà, consagrado Mausoléu Real construído na periferia da cidade, que fica aos cuidados da Iyámondè, sacerdotisa celibatária encarregada de cultuar e zelar pelos assentamentos dos reis mortos.
O novo Aláààfin visitará os túmulos de seus ancestrais e assim receberá a autorização para usar o adé (corôa), realizando nesta ocasião diversos sacrifícios. Ao terminar, ele deverá retornar ao Ipádi, seu quarto provisório.
Cinco dias após, ele deverá ir ao templo de Sàngó, em Kòso, e ali o novo Aláààfin é formalmente coroado, e um colar de contas chamado èjìgbà é colocado em seu pescoço.  Ao fim da cerimônia, ele retornará ao Ipadi, pois os atos ainda não estão completos.
Novamente cinco dias após, ele deverá ir até o templo de Oranyan, onde a espada de Oranyan, espada da justiça (idájó) será colocada em suas mãos, retornando ao ipádi.
Outra vez cinco dias após, ele deverá ir ao templo de Ògún para realizar sacrifícios, entre eles, um carneiro e um cachorro. Após isto ele retornará ao Palácio Real, mas desta vez entrará pelo portão principal e não se alojará mais no ipádi, mas sim, em outro comodo real previamente preparado e sacralizado com sacrifícios para a guarda do novo Aláààfin.
Ao novo rei será proibido aparecer em público, exceto durante as festividades anuais.”
¹

Se distanciando dos cultos das religiões dos candomblés e religiões-afros tradicionais, com seus rituais que não envolvem esta prática, ou quando existe é apenas  para os rituais fúnebres.

Diferente das demais culturas afro o Igbá do Bori é extremamente importante para dar continuidade ao ritual de Aṣeṣe, pois ao iniciar o ritual fúnebre, mais conhecido no sul por missa de Ègún ou Aressun, o Bori tem uma função importante para dar o “start” ao ritual fúnebre.  Desta forma prepara-se o elegun para o rito de passagem da vida para o mundo dos mortos.

É notório que o grande avatar e rei da nação Kabinda conhecido pelo nome de Kamuka, é cultuado somente dentro da Kabinda, as demais vertentes do batuque não rendem homenagens ou culto a esta divindade, que por sinal poucos Kabindeiros se rendem a comentar sobre esta divindade, ritual ou procedimento de trato. Criando um tabu ao redor do culto e do rei da nação (kamuka), jamais pronunciando seu nome ou tirando suas cantigas em qualquer lugar.


O Aláààfin Kamuka, assim cultuado no sul, abre uma possível porta para entender o pacto dele com os  Egun e o Igbàlẹ̀, prática ritualística no culto da Kabinda, tendo inicio no ritual ao saudar e reverenciar os ancestrais antes de qualquer cerimônia, ponto crucial para o inicio do ritual de iniciação, ficando a cargo de cumprimentar primeiro Kamuka no Igbàlẹ̀ e os ancestrais, pedindo permissão para poder cortar uma ave ou até mesmo um animal de quatro pés para a feitura.

Algo interessante que necessário se faz mencionar é que o povo da Kabinda-Nago, é a única nação que quando está em processo de iniciações ou assentamentos de Oriṣá, caso venha a falecer algum iniciado que pertença à família religiosa, a obrigação não irá se perder, caso a casa tenha feito o devido corte com equivalência de bichos oferecidos para angò. Claro que este procedimento ocorre apenas dentro do culto à referida Kabinda-Nàgó, pois qualquer outra religião afro-brasileira caso venha a falecer alguém da família durante uma obrigação arriada, perde-se toda a obrigação invalidando a feitura. “E deve-se despachar tudo que foi feito sem aproveitar nada”.

Um costume nas casas mais antigas Kabindeiras é o Entoto no meio do salão, onde dentro dele são feitas seguranças e assentamentos para Kamuka, uma das únicas vezes que esta divindade é trazida para dentro do Ilé. No entanto este ritual quase não é mais praticado nos tempos atuais.

Outro item importantíssimo é a língua usada dentro do ritual, pois toda a ritualística segue a língua Yorubá, até mesmo os Orins do Kamuká. Caso fosse um nkissi, seria muito clara a influência  Bantu entre os rituais da Kabinda, ficando assim mais uma vez enfraquecida a busca nas origens da cultura Bantu. Mesmo assim não podemos afirmar com precisão, pois até mesmo as rezas sofreram mutilações durante a passagem dos anos.
Apenas podemos ter certeza que ele é uma divindade Yorubá, pois seu Orukó carrega uma segregação do titulo do Aláààfin, como está claro em seu Orin;

Alárun dé Sàngó kámùka Bàbá obá olòfinà ti Sàngó kámùka

Outro fator que nos leva ao povo Yorubá é menção do Adóṣù (um elemento Yoruba que faz parte do ritual de feitura). Que mesmo não sendo usado nos rituais atuais ele é mencionado durante o Sirè dos Orisás, justo na reza da Iyá Yemanjá, a dona das cabeças;

Adòṣù mò gbé' ke ara orò adòṣù mò gbé' ke ara sé Sun (o iniciado que carrega na sua cabeça um " Adóṣù" reconhece o sagrado que vem do alto e a família espiritual, o iniciado reconhece a elevação que vem do céu, recebendo a família).

Um única dúvida que me fez iniciar esta matéria foi a etimologia da palavra Kabinda, por ela não possuir correlação com o povo Bantu. Então qual seria a origem da mesma?
Será que poderia ser alguma corruptela do povo Ketu, ou quem sabe a origem correta da palavra perdida? 

kábíyèsílẹ nda Kamuka” (fazendo saudação ao Rei Kamuka)

¹Tradução - Luiz Marins.
Texto - ABRAHAM, R. C.  Dictionary of Yoruba Modern, London, Houder & Stoughton, 1962 [1946].
JOHNSON, Samuel. The History of the Yorubas, London, Routledge & Kegan Paul, 1973 [1921]
Crédito:
Texto- Erick Wolff∞
Edição RobertoTamelini Jr.

Agradecimentos pelo apoio e incentivo - Luiz Marins

domingo, 22 de março de 2009

Logun Ede o principe de Ilesá

"Erinlè teria tido, com Oxum Ipondá, um filho chamado Lógunède (Logunedé), cujo culto se faz ainda, mas raramente, em Ilexá, onde parece estar em vias de extinção."
Do livro "Orixás - Pierre Fatumbi Verger - Editora Corrupio"

No brasil logunedé, conhecidíssima divindade que divide seu estado neste mundo entre a caça no meio da mata e a comer peixes sob as águas dos rios, pois sendo filho do caçador e de òsún.
Ele n suporta a cor vermelha e nem mesmo marrom.

Hoje, na Nigéria, a mais rica cidade chama-se Ilesa, e é a cidade de Logun Ede, que para muitos é metade homem e metade mulher, o que não é verdade. Logun Ede é um santo único, um Orixá rico que herdou tanto a beleza e agilidade do pai quanto a beleza e riqueza da mãe. Em Ilesa, uma das cidades mais prósperas da África, encontra-se o palácio de Logun Ede.

Itan
...oxum ipondá e erinlé

Um dia Oxum Ipondá conheceu o caçador Erinlé e por ele se apaixonou perdidamente. Mas Erinlé não quis saber de Oxum. Oxum não desistiu e procurou um babalaô. Ele disse que Erinlé só se sintia atraído pelas mulheres da floresta, nunca pelas do rio. Oxum pagou o babalaô e arquitetou um plano: Embebeu seu corpo em mel e rolou pelo chão da mata.
Agora sim, disfarçada de mulher da mata, procurou de novo seu amor.

Erinlé se apaixonou por ela no momento em que a viu. Esquecendo-se das palavras do adivinho, Ipondá convidou Erinlé para um banho no rio. Mas as águas lavaram o mel de seu corpo e as folhas do disfarce se desprenderam. Erinlé percebeu imediatamente como tinha sido enganado e abandonou Oxum para sempre.

Foi-se embora sem olhar para trás. Oxum estava grávida; deu à luz a Logun Edé.

Logun Edé é a metade Oxum, a metade rio, E é metade Erinlé, a metade mato. Suas metades nunca podem se encontrar.
Ele habita num tempo o rio e noutro o mato. Com o Ofá, arco e flecha que herdou do pai, ele caça. No abebé, espelho que recebeu da mãe, ele se admira.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

LENDA DE OTIN



"Otim esconde que nasceu com 4 seios"

 
Oquê, rei da cidade de Otã, tinha uma filha. Ela nascera com 4 seios e era chamada de Otim. O rei Oquê adorava sua filha e não permitia que ninguém soubesse de sua deformação. Este era o segredo de Oquê, este era o segredo de Otim. Quando Otim cresceu, o rei aconselho-a a nunca se casar, pois um marido, por mais que a amasse, um dia se aborreceria com ela e revelaria ao mundo seu vergonhoso segredo. Otim ficou muito triste, mas acatou o conselho do pai. Por muitos anos, Otim viveu em Igbajô, uma cidade vizinha, onde trabalhava no mercado. Um dia, um caçador chegou ao mercado, e ficou tão impressionado com a beleza de Otim, que insistiu em casar-se com ela. Otim recusou seu pedido por diversas vezes, mas, diante da insistência do caçador, concordou, impondo uma condição: o caçador nunca deveria mencionar seus quatro seios a ninguém. O caçador concordou, e impôs também sua condição: Otim jamais deveria por mel de abelhas na comida dele, porque isso era seu tabu, seu euó.


Por muitos anos, Otim viveu feliz com o marido. Mas como era a esposa favorita, as outras esposas sentiram-se muito enciumadas. Um dia, reuniram-se e tramaram contra Otim. Era o dia de Otim cozinhar para o marido; ela preparava um prato de milho amarelo cozido, enfeitado com fatias de coco, o predileto do caçador. Quando Otim deixou a cozinha por alguns instantes, as outras sorrateiramente puseram mel na comida. Quando o caçador chegou em casa e sentou-se para comer, percebeu imediatamente o sabor do ingrediente proibido. Furioso, bateu em Otim e lhe disse as coisas mais cruéis, revelando seu segredo: "Tu, com teus quatro seios, sua filha de uma vaca, como ousaste a quebrar meu tabu?"A novidade espalhou-se pela cidade como fogo. Otim, a mulher de quatro seios, era ridicularizada por todos.Otim, fugiu de casa e deixou a cidade do marido voltou para sua cidade, Otã, e refugiou-se no palácio do pai. O velho rei a confortou, mas ele sabia que a noticia chegaria também a sua cidade. 

Em desespero, Otim fugiu para a floresta. Ao correr, tropeçou e caiu. Nesse momento, Otim transformu-se num rio, e o rio correu para o mar. Seu pai, que a seguia, viu que havia perdido a filha. Lá ia o rio fugindo para o mar. Querendo impedir o Rio de continuar sua fuga, desesperado, atirou-se ao chão, e, ali onde caiu, transformou-se em uma montanha, impedindo o caminho do rio Otim para o mar.Mas Otim contornou a montanha e seguiu seu curso.Oquê, a montanha, e Otim, o rio, são cultuados até hoje em Otã. Odé, o caçador, nunca se esqueceu de sua mulher.

 Fonte: "mitologia dos Orixás" - Reginaldo Prandi

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