A MISSIONAÇÃO EM TERRAS DE LOANGO, KAKONGO E N'GOYO
Frei Bernardino Húngaro, assim chamado por ser da Hungria, parece ter sido o primeiro missionário a tentar a evangelização das terras ao norte do Zaire, especialmente o Loango. ( A. Prevost, op. cit., no Cap. I, Vol. VI, em nota da pág., 382 - Eduardo dos Santos, op. cit., pág. 96.)
Desembarcou no Sonho (ou Soio, Pinda) em 1645 com a primeira missão de capuchinhos. (a 25 de Maio)
Rezam as crónicas que Bernardino Húngaro tratou no convento do Sonho um viajante português. Quando regressou ao Loango, onde tinha comércio, este português elogiou muito a Frei Bernardino Húngaro na corte daquele Reino.
O Rei de Loango enviou então dois de seus filhos para o Sonho para serem instruídos e educados por Frei Bernardino Húngaro.
Os filhos, de regresso ao Reino, fazem com que seu pai chame para lá a Frei Bernardino. Escreve o Rei de Loango ao Governador de angola, certamente André Vidal de Negreiros (de 1660 a 1666) que, por sua vez, intercede junto do superior dos capuchinhos no Sonho (também Songo) e consegue o que o Rei de Loango pretende: a ida de Bernardino Húngaro. ( A. Prevost, op. cit., Vol. VI, pág. 382.)
Em 1663 Frei Bernardino Húngaro está no Loango tendo, segundo outras narrações, passado por Malembo e Kakongo. ( Eduardo dos Santos, op. cit., pág. 96.)
Foi muito activa a sua evangelização e parece que muito frutuosa, pelo menos aparentemente. Em pouco tempo instruiu o Rei e a Rainha nas verdades da fé, e baptizou-os e casou-os. Baptizou ainda o filho mais velho do Rei (pode depreender-se ter ele já baptizado no Songo os outros dois filhos que para lá haviam ido) e mais umas trezentas pessoas ligadas à corte. No espaço de um ano (lê-se em Prévost) teria baptizado umas 12.000 almas.
Mas viveu pouco. O muito trabalho arrasou-o por completo.
Adoece. O Irmão Leonardo, que havia sido chamado para o socorrer na doença, chegou para o ver expirar a 18 de Junho de 1664.
O Rei incumbe a este Irmão o ir pedir a seu superior um outro sacerdote para continuar a obra do Padre Bernardino Húngaro.
Enquanto vai o Irmão ao Sonho, um Príncipe de sangue real, ajudado por Cristãos apóstatas, tira ao Rei a vida e a coroa.
O usurpador pouco viveu. «Nos princípios de 1665, um dos filhos conseguiu reunir partidários e destroçar o chefe dos rebeldes que tinha tomado o Poder. Uma vez no trono, favoreceu a evangelização cristã no seu Reino». (Idem, pág. 97.)
Por falta de obreiros, o Reino acabou por voltar à idolatria.
Tomás de Sestola e André de Buti, capuchinhos, teriam passado por Cabinda em circunstâncias muito especiais, em 1673. Perseguidos e maltratados no Sonho, foram amarrados com os seus cordões de capuchinhos e arrastados de rosto em terra até às margens do Zaire. Recolhidos e levados por pescadores nativos, atravessando o Zaire, até Bomangoio, são recebidos por um negro humanitário que os faz seguir de tipoia para Cabinda. De Cabinda teriam tomado barco para a Europa. Não se vê mencionada qualquer actividade destes missionários em Cabinda. (A. Prevost, op. cit. Vol. VI, págs. 378/379.)
Fig. C11 - A graciosa Igreija Matriz de Cabinda 13-10-1957 |
Que ligação pode existir entre o que fica dito e o que, em seu estudo sobre Lândana, escreve P. J. Troesch? «Em 1673 uns frades recoletos belgas vão de Luango a Pinda, (Santo António). Em Malembo encontram um convento (antigo, desabitado) dos capuchos.»
Bem curiosa a data, 1673, que coincide perfeitamente. Mas o mais (Malembo, convento de capuchos... )?
Por 1684/85 o capuchinho Jerónimo de Merolla de Sorrento adoece gravemente na Missão do Sonho, onde se encontra desde meados de 1683.
Recebe nessa altura um enviado do Rei de Kakongo, com uma carta deste, mostrando a disposição de abraçar a fé cristã. Segundo a narração de Merolla, o Rei de Kakongo estaria casado com uma irmã do Conde de Sonho, que lha havia concedido com a condição de abraçar o cristianismo. Devido à doença, Merolla não pode, de momento, ir ao encontro dos desejos do Rei de Kakongo. Mas, desde já e enquanto não vai, pede duas coisas;
1. - Que ordene ao governador da ilha de Kairacacongo, no meio do Zaire, para que lá seja implantada uma cruz.
2. - Escolher em seus estados um terreno onde se possa levantar uma Igreja.
O Rei teria acedido.
Entretanto, um missionário chegado de Luanda, e cujo nome não se dá nas crónicas, sai com destino a Kakongo, já que Merolla continuava doente. Mas na capital de Ngoyo fica a saber da morte do Rei de Kakongo, do que havia pedido para ser instruído na fé cristã. Desconhecendo as intenções do seu sucessor, regressa ao Sonho.
De passagem por Kairacacongo repara que, de facto, lá se encontrava uma cruz erguida. O governador contudo não quer receber a «nova religião» sem saber as intenções e vontade do novo Monarca.
Nos começos de 1687 chegam novos missionários ao Sonho e com eles medicamentos. Merolla recupera a saúde e, restabelecido, pensa logo em seguir para Kakongo. Prefere embarcar directamente para Cabinda, fugindo a ciladas, onde chega em fins de 1687.
Pouco se demora em Cabinda e Ngoyo uma vez que, por comunicação do Mafuka, deve seguir para a corte do Congo onde o Rei, que devia ser D. Álvaro lX, e sua mãe, D. Potenciana, muito têm a expôr-lhe e a perguntar-lhe sobre religião e não menos sobre a festa da coroação.
Parece que desde a batalha de Ambuila (29 de Outubro de 1665), em que D. António perdeu a vida, a cabeça, a coroa e o ceptro... não mais teriam sido coroados os Reis do Congo.
A coroa e ceptro do Rei do Congo entrou nos despojos de guerra. Perdeu-se-lhes o rasto. Nem Luís Lobo da Silva, Governador de angola de 1688 a 1691, sabia ao certo onde se poderia encontrar sobretudo a coroa. Esta, segundo as crónicas, era oferta da Santa Sé.
Uma Bula de Urbano VIII (papa de 1623 a 1644) permitia que o Rei do Congo se fizesse coroar por um missionário capuchinho e segundo o rito romano.
Merolla teria sido pressionado a seguir para o Congo para se tratar de conseguir a coroa, levada para Luanda depois da batalha de Ambuila, e de proceder depois à coroação.
De tudo isto se depreende que a passagem de Merolla por Cabinda e Ngoio foi bastante fugaz. Não parece ter deixado qualquer traço de valor e não consta, tão pouco, que haja ido a Kakongo.
Mas, nas suas narrações, Merolla conta que, alguns anos antes, o Rei de Ngoyo, tendo recebido o baptismo, havia ameaçado os feiticeiros de suplício, caso não abandonassem essas práticas. Foi o Rei perseguido e teve de se refugiar noutra terra onde reinava um seu filho. Este, por medo, acabou por entregar o próprio pai, que morreu às mãos de um carrasco.
Isto aconteceu, como vimos já, a um Rei do Loango, por ter estabelecido o Cristianismo em seu Reino. Deve haver aqui confusão. Se encontra fácil prova para a perseguição feita ao Rei do Loango, convertido por Frei Bernardino Húngaro, é bem difícil comprovar-se o martírio de um Rei do Ngoyo.
Merolla deixou Cabinda e Ngoyo, a caminho da corte do Congo, a 7 de Março de 1688. (Idem, pág. 181 e seg.)
Em 1702 o capuchinho António Zucchelli tenta a evangelização em Kakongo e, depois, em Ngoio. Não encontrando apoio no Rei, antes contrariedades, regressa ao Sonho. (Eduardo dos Santos, op. cit., pág. 97.)
Em 1708 o Padre Colombano de Bolonha teria perguntado para Roma se poderia baptizar o Rei de Ngoyo, pretendente a uma filha do Conde de Soio, que eram cristãos, mas acrescentava que o Rei do Ngoyo se negava a deixar de vender escravos cristãos aos ingleses. Roma não concede a autorização para o baptismo.
Serve isto para provar, pelo menos, que já em 1708, havia cristãos no Reino de Ngoyo. Eram Bauoio ou seriam, como se encontram referências a isso, cristãos vindos do Soio (Sonho, Songo, Pinda) ?
De 1766, 10 de Setembro, a 30 de Dezembro de 1775 há três tentativas de missionação do Reino de Loango e depois do de Kakongo. ( J. Cuvelier, «Documents sur une mission française ao Kakongo (1766-1776), Bruxelles, Institut Royal Colonial Belge, 1953.)
1.a Tentativa
A 10 de Setembro de 1766 chegam ao Loango os Padres Belgarde, Astelet de Clais e Sibire.
Em Março de 1767, morre o P. Astelet.
Em Março de 1768, doentes, deixam o Loango os Padres Belgarde e Sibire e tomam o caminha da América.
2.a Tentativa
Em Agosto de 1768, desembarcam em Cabinda os Padres Descourvières e Joli. A 25 de Setembro vão para o Malembo e instalam-se, provisória mente, na aldeia de um preto cristão, aldeia de Musorango, - a umas três ou quatro léguas do Malembo.
Em 23 de Fevereiro de 1769, fixam-se em Kinguele (outros dizem Kiengele), capital do Kakongo.
Em Janeiro de 1770, o P. Descourvieres, doente, embarca para a Europa. O P. Joli, que ficou só, acaba por regressar também.
O P. Herbert, que a 14 de Abril de 1770 toma o caminho da Missão para vir fazer companhia e ajudar o P. Joli, não encontrando ninguém em Kakongo, volta à França.
3.a Tentativa
A 28 de Junho de 1773 descem na costa de lomba, ao norte do Loango. Em Julho tomam o caminho de Kakongo. Em fins de Julho ou começo de Agosto já estão no porto do Malembo. Morre ali o Padre Racine, da diocese de Besençon, e um leigo.
A 18 de Setembro de 1773 vão fixar-se em Kilonga, perto da lagoa (da Kilunga) que fica junto ao actual Sasa-Nzau.
A vista que dali se disfruta, diz num relatório o P. Descourvières, é. agradabilíssima. O lugar é bem situado, numa pequena elevação, a uns três tiros de espingarda de Kilonga. Estão a trezentos ou quatrocentos passos de um lago que tem boa água e que lhes fornecerá excelentes peixes se tiverem pescador.
Encontraram cristãos Basolongo ao sul de Kakongo. Foram sempre muito bem recebidos.
Em Dezembro de 1774 chegam mais seis missionários, quatro padres e dois leigos.
Nesta terceira tentativa vieram, ao todo, dez padres e oito leigos. Foram adoecendo, foram morrendo e outros regressam à Europa para salvar a vida.
Em Kilonga morrem dois irmãos leigos: um, a 29 de Novembro e, o outro, a 7 de Dezembro de 1773, portanto quatro missionários desde Agosto (o P. Racine e um leigo que morrem no Malembo) a 7 de Dezembro do mesmo ano (em cinco meses).
Em Junho de 1775 restam em Kilonga 5 padres e um leigo. E todos vêm a cair doentes. Deixam então o Kakongo, de regresso à Europa, em 30 de Dezembro de 1775.
O P. Descourvières, já no fim de sua estadia em Kakongo, escreve: «Os Reis protegem-nos e especialmente o de Kakongo, no território do qual nos fixamos; os príncipes e ministros favorecem-nos e o povo nos estima.»
É com imensa pena e somente forçados pela doença, depois de se dedicarem com afinco à aprendizagem da língua nativa ao mesmo tempo que à evangelização, que deixam as terras de Kakongo após estas tentativas.
(Cf. «Documents sur Mission Française à Kakongo, 1766-1776», par Mgr Cuvelier)
Desde 30 de Dezembro de 1775 a 30 de Maio de 1870 (95 anos depois) não consta ter aparecido, salvo certamente os padres capelães da nossa armada e muito de corrida, qualquer missionário por estas paragens.
Infelizmente parece que nem vestígios se encontram da Missão francesa e nem se sabe, ao certo, onde foram sepultados os missionários falecidos na região ido Malembo e Kilonga.
Da que eu chamo primeira tentativa de missionação - e não se me leve a mal e veja-se no que seque a razão desta denominação - pelos Padres da Congregação do Espírito Santo, começada em 14 de Março de 1866 com a chegada ao Ambriz dos Padres Espitallié e Poussot e do auxiliar Estêvão Billon, desses missionários nenhum venceu os rigores do clima.
Billon falece ainda no Ambríz a 25 de Setembro de 1866.
O P. Poussot, por doença, regressa à Europa e é substituído pelo P. Fulgêncio Lapeyre.
Em Luanda, para onde haviam seguido, a 28 de Março de 1869 falece o P. Espitallié e, a 18 de Janeiro de 1870, o P. Lapeyre.
A 7 de Dezembro de 1869 chegaram a Luanda os Padres Carrie e Dhyèvre. Assistem aos últimos dias e momentos do P. Lapeyre. A morte de seus confrades junto a uma série de contrariedades não são causas de grande animação, não. É certo que não foram poucas, e de toda a ordem, as dificuldades que tiveram de suportar os primeiros missionários do Espírito Santo. Mas temos de concordar também que lhes faltou, possivelmente, algum tacto, certo brio, prudência, coragem e humildade evangélicas para aquentarem essas dificuldades e sobretudo muitas incompreensões dos homens desse tempo.
Por outro lado, talvez tenham exorbitado um pouco. Deviam ter tomado somente conta dos territórios da Antiga Prefeitura do Congo - o que lhes fora entregue pela Sagrada Congregação da Propaganda da Fé pelo Decreto «Saeculo XV labente», de 6 de Setembro de 1865, com todos os deveres e direitos que tinham sido concedidos aos Capuchinhos pelo Papa Urbano VIII, em 1640, mas que deviam ser regidos pelas mesmas instruções da Propaganda da Fé, de 14 de Janeiro de 1726 (instruções que visavam, de um modo especial, salvaguardar a jurisdição total do Bispo de Luanda, portanto dentro dos direitos do Padroado Português) - territórios esses que iam, no máximo, até ao Ambriz e não para sul dessa vila e, de forma alguma, até Luanda.
Mas há males que chegam a dar em bens.
Num navio à vela, pertença de um tal Senhor Laborde, os Padres Carrie e Dhyèvre deixaram Luanda a 18 de Maio de 1870 e chegam a Lândana a 30 desse mesmo mês e ano. Estiveram na foz do Zaire e em Banana. Visitaram Cabinda, Malembo, Chinchoxo, Ponta Negra e Loango.
Depois desta exploração de estudo para a fundação de uma futura Missão em terras de Kakongo - que erradamente, mas admitamos, por ora, de muito boa fé, julgam ser terras francesas - regressam à França passando pelo Gabão.
Em 12 de Novembro de 1871 o P. Carrie está novamente de volta a Lândana, depois de ter passado por Lisboa onde visitou os filhos do Barão Puna (havia estado com o Barão no ano anterior, em Cabinda), que frequentavam a Escola Académica.
Vai novamente a Banana, visita a Porta da Lenha, Boma e Pinda.
Manda um relatório à Casa Mãe, em Paris, que a todos satisfaz e em que indica Lândana como o melhor local para a fundação de uma Missão.
No Boletim da Congregação do Espírito Santo, com data de 25 de Julho de 1873, se insere a fundação da Missão de S. Tiago de Lândana,
No próprio dia 25 de Julho de 1873, o P. Duparquet e o Irmão Fortunato sequem para Liverpool onde tomam o barco que os levaria à nova Missão. Chegam à Ponta Negra a 8 de Setembro de 1873. 0 P. Carrie aí os esperava. A 15 de Setembro, sete dias depois, já encontramos o P. Duparquet numa exploração pelo rio Chiloango. Tinha vindo por terra da Ponta Negra para Lândana. Os terrenos da Missão de Lândana foram comprados a 19 de Setembro de 1873 ao Peça Matenda. "A 1 de Novembro de 1873 a casa comercial Pinto & Faro, Lândana, vende uma casa à Missão de Landana por 250 libras esterlinas, pagáveis em Lisboa a 1 de Fevereiro de 1874, ao Sr. Juhel, director de barcos franceses, Largo do Pelourinho, 19-1' Andar."
Foi pois com a fundação da Missão de Lândana - oficialmente a 25 de Julho de 1873 - que a Congregação do Espírito Santo se Instalou definitivamente em Cabinda. Novo e crescente incremento é dado às Missões, em Cabinda. Durante uns bons 60 anos a evangelização de toda a Província salvaguardando o ministério de alguns padres seculares, esteve a cargo da Congregação do Espírito Santo.
No Estado de Cabinda fundaram-se as seguintes Missões:
LÂNDANA - 25 de Julho de 1873.
Boma - 1876
Nemlau - 1885
Luáli - 1890. Teve de ser fechada por causa da insalubridade da região e clima, que causou vitimas em pouco tempo.
Depois da Conferência de Berlim - 1885 - com a demarcação do Estado Independente do Congo, hoje República do Zaire, encerram-se as Missões de Boma e Nemlau, sucursais da de Lândana. No Estado Independente do Congo não queriam missões nem missionários que não fossem belgas.
O pessoal da Missão de Boma, bem corno os materiais, vêm para a Missão de Cabinda. Chegam a bordo do «Souverain» em 5 de Outubro de 1891. Instalaram-se na pequena casa do antigo proprietário Manuel António da Silva-a quem haviam comprado os móveis, casa e terreno (uns 240 hectares por umas 200 libras), a 28 desse mesmo mês e ano,
A data oficial da Missão de Cabinda é a de 8 de Dezembro de 1891.
Lukula - Zenze, 16 de Janeiro de 1893.
Matembo - Belize, 13 de Junho de 1922.
As Irmãs de S. José de Cluny fundam também as Missões femininas de Lândana e Cabinda.
Em Lândana, a 1 de Fevereiro de 1883.
Em Cabinda, 27 de Janeiro de 1893.
Como compreender e interpretar certas atitudes do Padre Carrie, e também do P. Augouard, quanto a julgar-se em terras francesas e não pertença de Portugal?
Ao largarem de Luanda, a 18 de Maio de 1870, teria sido intenção do P. Carrie e do P, Dhyèvre deixarem terras de Portugal?
«O P. Dhyèvre e Carrie deixaram Luanda a 19 de Março de 1870 para Banana e Lândana, julgando eximir-se às autoridades portuguesas.»
Fig. C 10 - A bela capela rural da Jomar 8-12-1956 no Prata |
E agora, fundando a Missão em Lândana, julgar-se-iam de boa fé em terras não portuguesas e antes francesas? Se assim pensaram bem se enganaram.
Vimos que Ferreira do Amaral acusa dois traidores portugueses e os padres da Missão de Lândana, com o doutor Lucan, de ajudarem Cordier a tomar Loango e Ponta Negra.
Depois de tudo o que expusemos na primeira parte deste trabalho, não era difícil ver e reconhecer o direito que nos assistia sobre as terras do Loango, quanto mais sobre as do reino de Cacongo, de que Lândana fazia parte. Parece que o P. Carrie, dos padres da Missão, era o mais ferrenho e o mais... francês.
O Padre Alves Correia em «Civilizando angola e Congo» escreve: «Não há dúvida que o P. Carrie e P. Augouard se julgavam em campo de labores por Deus e pela França.» (P. J. Alves Correia, «Civilizando angola e Congo». A. Brásio, op. e vol. cit., pág. 247.)
Por isso se nota o seguinte:
- No contrato que a Missão de Lândana faz com o Chefe Matenda, eram francesas as testemunhas.
- Quando os portugueses, em 1883, tentam mostrar e provar os direitos que tinhamos sobre aquelas terras, o P. Carrie não aceitou a arbitragem do delegado português, que já devia ser João José Rodrigues Leitão Sobrinho.
Talvez por isso, depois do tratado de Chinfuma, de bordo da corveta «Rainha de Portugal» e com a data de 14 de Outubro de 1883, o comandante Guilherme Augusto de Brito Capelo comunica à Missão o facto nos termos seguintes:, «Tendo sido negociado um tratado entre Portugal e os chefes indígenas pelo qual é solenemente reconhecida a Soberania e Protectorado de Portugal, sobre os povos que habitam os territórios que do «Malembo» se estendem até ao rio «Massabe», tratado este que foi firmado na grande reunião dos Príncipes e cavalheiros, que teve lugar no dia 29 de Setembro próximo passado, cumpro agora o dever, como Delegado do Governo Português, de enviar a V. Ex. cia a cópia autêntica do referido tratado, a fim de que V. - Ex. cia dele tomando conhecimento, possa ficar ao facto das circunstâncias que do mesmo se derivam, e cujas vantagens tanto para os Europeus como para os indígenas, regulando as relações entre uns e outros, V. Ex. cia decerto avaliará, com a sua elevada inteligência e conhecimento prático do país e seus habitantes.» (J. C. J. Rooney, «As Missões do Congo e angola» in «Portugal em África», 1.' Série, ano 1900, pág. 439.)
Já em 15 de Setembro de 1879, quatro anos antes, o Secretário Geral do Governo de angola havia visitado a Missão de Lândana, e o P. Carrie era Sub-Prefeito Apostólico desde 1876, honra, afirmam, que encheu de satisfação os missionários.
Fig. C9 - Igreija da Missao Catolica de Landana, benzida a 14-8-1904 |
«Por toda a parte, continua o P. Rooney, encontravam os nossos padres profundos vestígios da civilização portuguesa: vestígios que se deparam em toda a costa d'África, e nas grandes estradas de comunicação através do continente negro.»
Que mais seria preciso dizer sobre a nossa presença e direitos sobre Lândana e os mais territórios ao norte do Zaire perante estas afirmações de um padre estrangeiro? Como interpretar pois as atitudes do P. Carrie coadjuvadas pelo P. Augouard?
Mas as resoluções tomadas pelas populações da Massabi, Lândana e depois Cabinda e a resolução da Conferência de Berlim veio pôr fim a todas as intenções e pretensões.
«Em 1885, escreve o P. Alves Correia, caía sobre os missionários do Loango o duche frio do tratado de Berlim: Lândana era portuguesa, porque encravava no País de Cabinda. Doravante deviam ter sentido o P. Carrie e os seus colegas que não eram os missionários desejáveis naquelas partes: que os deveriam substituir colegas de todo novos e sem ligações com a Missão do Loango, que continuava francesa.» (P. Alves Correia, op. cit.)
Mas mais, muito mais interessante e até muito mais convincente para quem desejar, leal e honestamente, ver e sentir até que ponto a presença de Portugal se impunha e marcava naquelas terras, mesmo do Loango, e como uma das provas mais irrefutáveis, basta o seguinte:
1 - A tipografia da Missão do Loango (tipografia que de Lândana foi levada pala lá pelo P. Carrie) editou, em 1890, a «Grammaire de La Langue Fiote-Dialecte du Kakongo» sendo seu autor Mons. Carrie.
2 - Em 1902, a mesma tipografia do Loango imprimiu «Le Dictionnaire Vili Français» do P. Marichelle, C. S. Sp.
3 - Em 1907, na mesma tipografia, o P. Marichelle manda imprimir «Methode Pratique pour l'étude du Dialecte Vili"
4 -Em 1919, ainda na tipografia do Loango, é impresso o «Lívret Congolais-VocabuIaíre et Premiers Exercices Vili-Français»
5 - Em 1929, os PP. de Scheut em Turnhaut (Belgique) imprimem «Premíers Elements de Français - Malong Mat'ete Ma Kifaranse» da autoria do Fr. Mertens.
Ora, estes dialectos Fiote, Vili, Kikongo, Kioio, etc. etc., são irmãos e com não mui grandes diferenças entre si. Falam-se no País de Cabinda, no Congo Brazaville e na República do Zaire.
O curioso está em se encontrar em todos esses dialectos muitas dezenas, mesmo muitas centenas, de palavras de origem portuguesa, hoje ainda existentes e correntes mesmo nos povos que adoptaram oficialmente a língua francesa.
E o fenómeno - bem comprovativo da nossa presença e influência de séculos - já se apresentava no tempo de Mons. Carrie.
Basta folhear a gramática dele de 1890...
Como se pode compreender (sobretudo em pessoas que se dedicaram à língua desses povos, sendo uma delas o P. Carrie a quem Guilherme Capelo pôde escrever «COM a sua elevada inteligência e conhecimento prático do país e seus habitantes») a existência e assimilação dessas palavras sem a presença longa e constante do povo - no caso o POVO PORTUGUÊS - que consegue introduzir e fazer adoptar termos e formas da sua língua? Esta é, sem dúvida alguma, uma das provas mais irrefutáveis a favor da nossa presença nos reinos de Loango, Cacongo e Ngoio. Mas o melhor é passar a dar alguns exemplos desses termos para que se não fique na simples afirmação. São só alguns. Mas podem encontrar-se nos livros que citamos muitíssimos mais. Para já, vamos a algumas palavras apanhadas, aqui e ali, na «Grammaíre de La langue Fiote-Dialecte du Kakongo» de Mons. Carrie. Desejamos fazer notar que não existe o «r» nestes dialectos. É sempre, ou quase sempre, substituído por «l».
Até a Europa, toda a Europa, só tinha valor para esta gente na medida em que a ligava a Portugal -PUTU- e os brancos de outras nações na medida em que se uniam aos portugueses!
E não era raro ouvir-lhes dizer: «Vem ali um branco, um ngeleza e um nfalansa.» E, para eles, o branco era o português. ( Mesmo que muito custe e vá contra a opinião de de J. Van Wing S. J. (Études Bakongo) que é mais do que verrínoso contra os portugueses "Cf. o. c., pág. 81" ).
Portanto, como é possível a alguém que faz uma gramática, que sabe a língua de um povo o nessa língua tropeça constantemente com palavras traduzidas de outra língua, como é possível negar a influência, dominação e posse do povo que tal ascendente teve e tem?
Dada a posição tomada, depois do tratado de Berlim o P. Carrie deixa Lândana. Mas não o faz, louvores lhe sejam dados, sem que fique tudo bem organizado. O P. Carrie havia sido tão bom missionário como... bom francês!
Em 1886 toma o caminho da França donde regressa sagrado Vigário Apostólico do Loango.
O julgar-se em território francês (?), foi, pelo menos, um "feliz engano" Devido a ele a Congregação do Espírito Santo fixou-se então realmente em terras de África.
E a data de 25 de Julho de 1973 (Centenário da Missão de Lândana) exige comemoração condigna.
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