12 CABINDAS HISTORIA - CRENÇAS - USOS E COSTUMES: TOMO XII

NOMES E APELIDOS



«Le nom - diz Foucart - (chez les anciens Eqyptiens comme chez nombre d'autres peuples), n'était (oú n'est) pas une simple désignation ... »

(Citado por P. Leo Bittremieux em «La Société Secrète des Bakhimba ou Mayombe»).

Podemos colocar muito bem entre o número de outros povos para os quais o nome não é uma simples designação os nossos Bakongo, Bauoio, Basundi, etc., etc.

A imposição, de facto, de um nome a um indígena - pelo menos já depois de crescido - representa, de certo modo, urna mudança de individualidade. E essa mudança dá-se com mais frequência do que se desejaria.

Não há missionário algum ou funcionário, a cargo de registos de indígenas, que não tenha encontrado a comprovação do que acima se afirma.

Foram baptizados ou registados com um nome de família ou o nome que as circunstâncias indicaram na altura do nascimento. Posteriormente outras circunstâncias - de ordem individual, familiar ou social - os levam (lhes impõem mesmo) a mudar de nome.

E, não raro, esquecem o que tinham antes, aquele com que foram baptizados ou inscritos no registo civil.

Segundo Van Wing - e explanado pelo B. Bittremieux- os elementos constitutivos do homem (na filosofia dos Bakongo, Bauoio, etc.), são:

a) o corpo com o sangue;

b) a alma (espiritual) princípio de vida e que reside no sangue;

c) o nfumu-nkutu - chefe da orelha - espécie de alma sensual que reside na orelha, faz funcionar o ouvido e a vista e pode divagar (durante o sono e a síncope);

d) o NOME. Este completa a individualidade humana. O nome parece ser a alma sensual, isto é uma espécie de «dualidade» e deve, pois, mudar sempre que haja como que mudança substancial do indivíduo .

( J. Van Wing, Etudes Bakongo, 2.a ed., Desclée de Brouwer, Bruxelles, 1959, pp. 289 e 376).

Creio bem que se notará esta mudança em alguns dos casos que irão aparecer.

A criança recebe, não havendo circunstâncias especiais que acompanhem o parto, o nome dos avós. Este parece-nos o princípio geral.

Temos, para o caso, um exemplo frisante. E até, para mais facilidade de comprovação, aparecem três filhos, sendo os dois primeiros do sexo masculino e o terceiro, do sexo feminino.

Baptizei, na aldeia do Fubu, junto ao Tando-Nzinze, no mesmo dia, essas três crianças irmãs.

O pai chamava-se BUATA e a mãe, NDOMBE.
BUATA era filho de NGUTU e de MAMBU.
NDOMBE, de MADEKA e de MUILA.

O mais velho dos pequenos no baptismo tomou o nome de Lourenço e tinha, em família, o nome de NGUTU. Ficou a ser Lourenço NGUTU.

O segundo foi baptizado com o nome de Francisco. Em família tinha o de MADEKA Francisco MADEKA.

O terceiro, a menina, recebeu, no baptismo, o nome de Josefina e, em família, tinha o nome de MAMBU. Ficou Josefina MAMBU.

Pode notar-se, perfeitamente, o seguinte:

O mais velho tomou o nome do avô paterno;

O segundo, o do avô materno;

O terceiro, a menina, tomou o nome da avó paterna.

É esta, na verdade, a regra: tomam os nomes dos avós.

(Pode ser conferido o que aqui afirmamos pelos registos da Missão Católica do Lukula-Zenze, de 1944).

Há, porém, circunstâncias que acompanham o nascimento da criança ou afectam, posteriormente, a vida deles como que mudando-lhes a individualidade...

O nome, então, será o que essas circunstâncias exigem ou a vida que se vem a tomar - fazer parte de certa sociedade, ser nomeado Nfumu-Nsi, Ntoma-Nsi, etc., etc., ligação com outras famílias, v. g., Jack, Wilson, Espanhol, Franque.
 

ALGUNS CASOS

Isabel LUFUA

Lufuá vem do verbo Fuá, Kufuá - morrer.

E porque deram o nome de LUFUÁ a esta pequena que, mais tarde, veio a ser baptizada com o nome de Isabel?

Por que nasceu tão em perigo de vida que todos diziam: «vai morrer».

Daí o dar-se-lhe o nome de Lufuá.

Faustino BUMUENIKO

BUMUENIKO, palavra composta de: BU (por ABU) - MUENE - e KO.

BU - Agora.

MUENI - Viu (pret. perf. do verbo Mona - Ver)
KO - Não

BUMUENIKO - (Até) Agora (ainda) não se viu.

Razão de tal nome? Foi tão difícil o parto, tão demorado que chegaram a perder as esperanças de verem a criança fora do ventre materno. E o pai dizia-me: «Foi mesmo mistério, mesmo milagre. Toda a gente julgar não ver mais o filho.»

KINZIMBUKILA

Nome que se dá a uma criança depois de a mãe ter vivido bastantes anos e sem ter filhos até ali.

Conhecemos uma boa velhota, na aldeia do Lusiese, com este nome.

Vem, o termo, do verbo Zimbukila - Aparecer - de repente, sem ser esperado. Ser surpreendido por...

LELO

Nome que recebe a criança que nasce depois da morte de vários de seus irmãos.

Vem da expressão: Lelo - Lelo, lukeba - Cautela, ter cuidado.

Ou do advérbio de modo Lelo - Apesar de tudo, desta vez.

Era, também, como que um aviso à família para que tivesse cuidado e «não fizesse feitiço» para que, «apesar de tudo», este não morresse.

MANTANDU

Está por MUNA-NTANDU - Na planície.

Criança que a mãe deu à luz fora de casa, no campo, na planície.

PELESO

Deturpação do nosso termo «Preso».

Criança nascida :estando o pai na cadeia, preso.

LISUKULULO

Nome que acaba por receber-e pode ser até o primogénito - o filho que ficou depois de todos os seus irmãos terem falecido.

Vem da expressão: Sukulula ou Sukula kinsamu - Falar, narrar o acontecido.

Espécie de aviso e de anúncio para que todos saibam que, apesar de hoje não ter mais filhos (ou de não ter agora outros irmãos), outras teve que morreram.

PINTASELIGO

Está por Pintassilgo. Foi dado este nome a uma criança que nasceu precisamente no momento em que o P. Pintassilgo passava na aldeia.

O autor do presente trabalho também chegou a ter a mesma «honra». Por ter atendido, na aldeia do Kakata, uma parturiente momentos antes do parto, foi dado ao recém-nascido o seu apelido.
 

NTUTI

Nome dado ao filho de uma rapariga que não haja passado pela «Casa da Tinta».
A rapariga, enquanto não passa pela «Casa da Tinta» e procede a todo o cerimonial que lhe permite tomar estado, não pode ter relações sexuais, seja com quem for e tenha a idade que tiver O filho que lhe nascer é filho da prevaricação, é NTUTI.

SONSA

Quando alguém passa muito tempo sem ler filhos, o primeiro que nasce toma o nome de SONSA.

Sonsa, Kusonsa - Falar, narrar.

Notar que há certa diferença entre Kinzimbukila e Sonsa.

No caso de Kinzimbukila quase se haviam perdido todas as esperanças, ou tinham mesmo sido perdidas. Aparece sem ser esperado.

No caso de SONSA não se haviam perdido as esperanças, ainda que a criança venha a nascer muito depois do casamento.

NSAFU ou NSELO

A mulher tem de se abster de coabitar, de fazer vida conjugal, enquanto amamenta o filho e enquanto este não começar a caminhar com certa segurança. Mesmo depois disto terá que deixar passar o primeiro mênstruo dessa ocasião.
 

Não o fazendo, o filho que nasça destas relações (ilegais para eles) toma o nome de NSAFU ou NSELO (NSELO = bastardo, degenerado).

O NISAFU é, pois, filho da maldição. Haverá castigos. Um dos castigos será a falta de chuva. Os esposos terão que ir ao Ntoma-Nsi.
 

Para levantar a maldição, um dos castigos impostos ao homem era o de subir ao cimo de uma palmeira levando à cabeça uma cabaça cheia de água e deixá-la, depois, cair.
 

As pessoas presentes - e serão muitas ou mesmo todo o povo - gritava:

Oh!... NSAFU... NSAFU...

Para NSAFU encontram-se as significações seguintes:

1. - desmazelado, sujo;
2. - indecente, pouco conveniente, imodesto, obsceno,

NSAFU, nome dado à criança nascida fora das leis da decência!

A criança que ao nascer, ou mesmo depois, é levada ao curandeiro ou adivinho, toma o nome do Nkisi consultado.

Os mais comuns, neste caso, são:

MALONDA - para as doenças de peito e febres (Nzangala).
UMBA - doença do ventre.

Assim, se a criança vai ao nkisi Malonda, tomará este nome.

Se vai ao Umba, chamar-se-á UMBA.

E são bem comuns estes nomes.

Nomes dados aos Gémeos - Bana Bibaza ou Bana Basimba - e a superstição que os acompanha:

Os gémeos são tidos por filhos do Nkisi-Nsi. São Bana Babakisi - filhos do Nkisi.

Receberão, conforme o sexo, os seguintes nomes:

Se são dois rapazes - NHIMI e KUMBU.

Se são duas raparigas - NZUZI e SIMBA.

Um rapaz e uma rapariga - BAZA e SIMBA.

Uma rapariga e um rapaz - NZUZI e KUMBU.

Em Cabinda também aparece o nome de Baza dado a raparigas e o de Simba a rapazes.

NHIMI, KUMBU, NZUZI e SIMBA são, também, nomes de animais.
NHIMI (tido pelo mesmo que NGO) - Leopardo.
KUMBU - Pantera.
NZUZI - Animal felino, grande gato selvagem.
SIMBA - Animal da família do manguço.

Nhimi, o leopardo, é mais forte do que o Kumbu, a pantera.
Nzuzi, mais forte do que o Simba.

Daqui o dar-se o nome de NHIMI e de NZUZI, conforme os casos, ao primeiro dos gémeos que sai do ventre materno porque, dizem, é mais forte e mais esperto do que o seu irmão, tanto que conseguiu sair primeiro.
 

Os gémeos são excepção em toda a parte. Para os Bakongo, Bauoio, etc., etc., são tidos por filhos do Nkisi-Nsi. Ora este, o Nkisi-Nsi, é essencialmente bom. Os Basimba também são bons e, até certo ponto, são uma benção.

Portanto, há que os considerar, fugir de os ofender, guardar-lhes respeito e não lhes recusar o que pedirem.

Os gémeos vivem muito unidos um ao outro. As vezes adoecem ao mesmo tempo e até podem morrer quase a seguir um ao outro.

As mães, quando um dos gémeos morre, não deve chorar. Deve, pelo contrário, rir-se e cantar. É que, se chora, trazendo desgosto para o que fica, o que partiu já pode vir buscar o que ficou...
 

Nada se deve recusar aos gémeos, aos Basimba. Quem recusa o que eles pedem será castigado, regra geral, com a surdez... Mas recuperarão a surdez logo que paguem alguma coisa!...
 

Como se consegue ter gémeos?

É que há gémeos espíritos diferentes dos nascidos dos homens!

Os gémeos espíritos habitam nas lagoas e nos rios, regra geral nos pontos em que a água faz redemoinhos.

Há também alguns pequenos montes, raros, que são o seu habitat.

Ora estes gémeos espíritos, que vivem nos rios e lagoas, têm, debaixo da água, uma verdadeira aldeia onde nada lhes falta.

Cada gémeo vive dentro de uma caixa tendo a tampa a servir de porta.

Só de dia o Rei (o chefe) dos gémeos, denominado PURGUEI ou PULUKUSO - nome de um peixe - levanta a tampa de cada caixa para que os gémeos espíritos saiam à procura de alimento.
 

Acontece que estes gémeos, como qualquer ser humano, podem simpatizar com qualquer ser mortal.

O homem que de canoa passar por esses rios ou lagoas, se com ele os gémeos espíritos simpatizaram, sentirá que a vara com que conduz a canoa lhe ficará presa! São esses gémeos quem lha segura!
 

Ao voltar a casa, tendo relações com a esposa, esta conceberá... gémeos. Se a simpatia dos gémeos espíritos for muito grande por tal ou tal pessoa, esta poderá vir a ter três ou mais gémeos!
 

Logo que se dê o parto de gémeos o pai terá que levar, ou mandar, alguma coisa ao rio ou lagoa onde lhe parece ter tido a «graça» de ser seguro pelos gémeos espíritos.
 

Assim farão os próprios gémeos, quando já crescidos, todas as vezes que passem pelas lagoas ou redemoinhos dos rios.

FUTI e NLANDO

Será o nome que recebe a criança que venha a nascer depois de um parto de gémeos. Dá-se um ou outro nome indiferentemente.

SUNDA ou ISUNDA

Nome que recebem - e são também tidos por Bana babakisi - os que nascem saindo primeiro as pernas.

É que «saltam» por cima de regra geral, que é de nascerem começando pela cabeça.

SUNDA, ISUNDA vem do verbo Kusunda = Saltar.

ALCUNHAS E APELIDOS

Raros são, entre os indígenas, os que não têm uma alcunha.

E o europeu não escapará a este «baptismo».

O indígena raríssimas vezes alcunhará alguém baseado nos defeitos físicos dessa pessoa. Procura, sim, uma alcunha que lhe retrate o carácter, a pessoa moral. E nisto são verdadeiros psicólogos.
 

Quem viver entre os Cabindas - País de Cabinda - que procure saber a alcunha que lhe deram. Pode ser que leve tempo a sabê-la. Mas tem-na.

Muitas das alcunhas, senão a maioria, são tiradas dos belos provérbios que possuem.

Alguns exemplos

LIMANHA LIMBU = Pedra do mar.

Vem do provérbio
Limanha limbu:
Naveka Nzambi ala bundula liau.

Pedra do mar:

Só Deus a derrubará.

Aplica-se a quem está bem seguro no poder, Assim como os penedos do mar não saiem, apesar do contínuo bater das ondas, assim também a pessoa bem segura no poder não é derrubada com facilidade.
 

ILOLO KINTANDU

É a Anona das planícies (Annona arenaria, Thonn)

IIolo kintandu:
Podi  mana via mbazu ko.

A anona da planície:
Não pode acabar pelo fogo.

Passam as queimadas, queimam-se as folhas da anona da planície, a casca, fina mas semelhante à cortiça, fica quase torrada, mas de novo, oito a quinze dias depois, tudo rebenta com mais vigor.
 

Contrariedades, quase perseguições não «queimaram» tal pessoa (que conhecemos, bem como a Limanha Limbu), Saiu delas com mais vigor e coragem.

FINGA NGO

Finga Ngo mu lutambi

Insultar o leopardo (por se lhe verem) as pègadas.

E se, em lugar de pègadas, fosse o próprio leopardo?

Faltariam pernas para fugir...

Finga Ngo é o nome que se dá ao que critica o superior na ausência, pelas costas. Que de frente nada diz. Que é cobarde.

BIPALA SISI

Apelido dado à pessoa que de nada tem medo.

LUVALI

É o esquilo. Aplica-se a pessoa esperta e que com nada se atrapalha.

DUKULA

Do verbo Dukula - Verter, derramar.

Pessoa que fala muito, que passa o tempo a «verter» palavras pela boca fora, mas de poucas obras.

KUNDUMBILI

Carraça.

Pessoa agarrada a suas ideias e que não volta atrás nos trabalhos encetados e ordens dadas.

KUANGA NSOLO

De:
Kuanga - Cortar
Nsolo - Caminho, atalho.

O que corta o caminho. Dado aos que têm uni caminhar marcial, batido, como quem marca ou corta o caminho por onde passa.

NKOKO NDIBU

Nkoko - Tantã
Ndibu - Surdo

O tantã dos surdos... Indivíduo que fala tão alto que até os surdos ouvem!

Não nos queremos alongar mais neste capítulo.

Tudo o que aí fica é do nosso conhecimento directo e, no que diz respeito a costumes e tradição, colhido da boca dos «velhos».

Os nomes, apelidos, alcunhas são todos de pessoas que connosco contactaram.

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