MA-KONGO OU KAPITA
No País de Cabinda, como já temos visto, há a região chamada Kakongo onde habitam os Bakongo e onde o Nfumu Nsi, o Rei, era tratado por Ma-Kongo.
Mencionamos já os limites de Kakongo, antigo Reino de Kakongo. Etnogràficamente entra ainda na República do Zaire. A sede, porém, esteve sempre do nosso lado, primeiro em Kiengele (ou Kinguele), e, depois, certamente há mais de 70 ou 80 anos, em Kaio-Kaliado, na área do Posto Administrativo de Tando-Zinze.
Ora, estas terras de Kakongo ainda hoje deveriam. ser governadas por um Chefe (Ntinu-Rei) tratado por Ma-Kongo. Assim não acontece. Desde há muitos anos que são governadas (em assuntos de usos e costumes) por um Kapita, que era a dignidade logo a seguir a Makongo.
Contudo, este nome de Kapita não é antigo. Aparece somente nos fins do século XVIII, começo do século XIX.
Fazem-no derivar da palavra Capitão ou Capitaine.
Quantos Makongos teriam governado a região de Kakongo, e quando e porquê o governo passou para as mãos de um KAPITA?
Esta pergunta vem à mente dos curiosos e, sobretudo, à dos que viveram muito tempo em contacto com os povos de Kakongo.
Admite-se como certa a vinda de Makongo (e seus irmãos ou primos - para eles, os primos são chamados irmãos) para a margem direita do Zaire.
Sabemos que, em 1883, dois anos antes da Conferência de Berlim, o Comandante da Corveta «Rainha de Portugal» - Guilherme Augusto de Brito Capelo - assinou, como Delegado do Governo de Sua Majestade EI-Rei de Portugal, no morro de KINFUMA (em Lândana), a 29 de Setembro desse ano, o tratado com o Príncipe TALI-e-TALI e mais autoridades gentílicas.
Ora, Tali-e-Tali (devia escrever-se Ntali-Ntali ou Nta-Ntali) aparece nos documentos com as designações seguintes:
- «Tali-e-Tali, Príncipe Regente do Reino de Kakongo»
- «Signal do Príncipe Tali-e-Tali»
- «Signal do Príncipe Tali-e-Tali, Regente do Reino de Kakongo.»
E não nos resta dúvida alguma de que se em 1883 houvesse algum Rei Makongo a governar as terras de Kakongo, o contrato ou tratado de Kinfuma seria assinado por ele, Makongo - como Rei - e não pelo Kapita Ntali-Ntali.
Os velhos e a tradição contam muitas coisas sobre o assunto e dão as suas explicações ao facto. E não se deve ter grande receio em as aceitar como certas. É que os povos que não tiveram ou não têm história escrita comunicam-na oralmente, com bastante precisão, de pais a filhos.
Nos tempos que - correm, já com quem saiba escrever, começam a passar para o papel o que passavam de mente para mente.
Nestas condições está a lista, tida como oficial, que o VI Kapita, André Sozinho Loemba, me confiou em 1943.
«A fé e amor que tenho a este torrão querido - PAíS DE CABINDA;
Eu, ANDRÉ CAPITA SOZINHO, Príncipe vivente que reina pelos direitos deixados de seus descendentes; que pelo voto comum dos povos de cima de KAKONGO, até as margens do rio Loango (Lândana) pelos seus Regedores, sobas, chefes e habitantes em geral, me foram dados no recente dia 22 de Setembro de 1940 (vinte e dois de Setembro de mil novecentos e quarenta) na localidade do povo de CAIO-CALIADO, área do Pôsto Administrativo do Tando Zinze, - Que, no intimo e alto pensamento e da curta vida também desconheço a quem virá assumir êste cargo - criei o novo Relatório, mencionando os meus colegas antigos para não ficarem esquecidos na memória do pôvo e ficando definitiva lembrança ao Estado Português.
Cujos os nomes desses príncipes são os seguintes:
1. - Capita Muênimpolo, êste foi admitido como Rei de toda a área de Kakongo.
2. - Ntali-Tali, foi o sucessor do seu pai a quem também a nação Portuguesa recebeu.
3.- Capita Maquenengo, também filho do Rei Muenimpolo, cujo sucessor foi do seu irmão.
4. - Capita Tala Nzambi, sobrinho de Maquenengo.
5. - Capita Baçanza, primo de Maquenengo.
6. - André Capita Sózinho, o actual Rei vivente - Cuja posse foi cedida e tomada em 22-9-940. Em face e na presença dos seguintes representantes dos povos do alto e baixo de Cacongo à margem do rio Loango (Lândana) testemunhos: -»
Seguem-se 21 nomes de Regedores, Sobas e Chefes do Kakongo do lado de Cabinda e mais 7 do lado da actual República do Zaire.
E o Kapita termina desta forma:
«Estes todos estiveram na reunião naquele dia quando recebi o cargo de Rei, C. Muênimpolo, que eu não engano ninguém.
Em 22 de Setembro de 1940.
André Sózinho Loemba faleceu em 1953.
Estamos em presença de dois factos:
1. - Por princípio, Kakongo devia ser governada por um Makongo. Não o é.
2. - As terras de Kakongo têm, como Chefe clánico, um Kapita. O Kapita do tratado de Kinfuma de 1883 - Ntali-Ntali - é o segundo da lista dos Kapitas.
Desde o Kapita Muenimpolo nunca mais Kakongo foi governada por chefe a quem dessem o nome de Makongo, ainda que apareça um «Makongo» em Bumelambuto, que pretende ser o dono da terra de Kakongo mas a quem ninguém obedece como tal.
Aliás, na tomada de posse do André Sozinho Loemba aparece um Tate Mafuca, em XV lugar, antigo soba de Bumelambuto e que deve ser o mesmo que, na lista dos Makongos - que veremos no fim - se nomeia em VIII lugar como sendo o Makongo Mua Tate.
Na verdade nunca notei que o dito Makongo de Bumelambuto fosse tido por chefe clánico de Kakongo. Era até mínima a sua autoridade. Apenas o consideravam como regedor duma certa área e chefe da aldeia de Bumelambuto, também no Posto Administrativo de Tando-Zinze.
Por outro lado é sabido que a par do Rei, fosse ele Makongo, Maluango, Masundi, etc., etc., existia sempre um grande mágico ou Nganga, e quase sempre o da chuva (Nganga Mvula) que tomava, precisamente, o mesmo nome do Rei mas com a designação do cargo que lhe era próprio: Nganga.
Tínhamos, assim, um Nganga Makongo, Nganga Maluango, Nganga Masundi etc. etc., que, de modo algum, se podia confundir ou confundiam com o Makongo simplesmente ou Ntinu Makongo, Ntinu Maluango... Rei Makongo, Rei Maluango.
Fig. P. 18. - Estanislau Kimpolo |
Temos ainda diante de nós o facto histórico que nos facilita a prova de que as terras de Kakongo, a partir de certa época, passaram a ser governadas por um Kapita: é o do tratado de Kinfuma, em Lândana, assinado em 29 de Setembro de 1883.
E o tratado, como já afirmamos, é assinado pelo Kapita Ntali-Ntali, o segundo da ordem cronológica dos Kapitas.
Fosse o Ntinu Makongo quem governasse, o tratado seria assinado por ele e não por Ntali-Ntali.
Ntali-Ntali estava no poder em 1883. Sabemos que uma cópia do tratado foi entregue ao Kapita Ntali-Ntali bem como uma bandeira nacional, a monárquica, que pudemos ver muitíssimo bem conservada em 1943 (mas não a tem já o actual Kapita) e que o Kapita André Sozinho Loemba nos mostrou com todas as suas outras insígnias
E não fossem estes - os Kapitas - os Chefes do clã Kakongo não lhe teriam sido entregues a bandeira monárquica, a cópia do tratado, etc., etc. que sempre procuraram guardar em sua posse até que se perderam ou o tempo as deteriorou (v. g. a própria bandeira do Kapita, cuja fotografia possuímos desde 1943, e que a formiga branca destruiu).
Desde o Kapita Muenimpolo nunca mais se apresenta um Makongo à frente das terras de Kakongo.
Qual o facto ou factos que levaram o poder às mãos dos Kapitas?
1. Versão
Makongo Mua Sonho Nzobo adoeceu com a lepra.
Mandou chamar o Nganga, o curandeiro. Este, antes de comunicar o diagnóstico e de dizer o remédio que pretendia aplicar, perguntou ao Rei:
Responderam:
- Deixa-nos, primeiramente, que nos reunamos em segredo a ver o que cada um pensa e o que se resolve.
Unânimemente, entre eles, pensaram e disseram:
- O quê? Cortar a cabeça a uma filha de Príncipe? O Rei está velho e doente. Matar uma filha nova? Não.
Voltaram ao Rei:
E todos voltaram a suas casas.
Ficou o Nganga e o Makongo.
- Vês, disse o Nganga, que não gostam de ti? Fiz isto para os experimentar, pois, não preciso de matar a rapariga para te curar. Basta tirar-lhe sangue de uns pequeninos golpes que lhe faça. Manda vir uma rapariga da família dos Príncipes.
O Rei chamou o sobrinho Mue Mpukuta e explicou-lhe tudo.
Mue Mpukuta tinha uma sobrinha, chamada Mue Nzovo, filha de uma sua irmã. A irmã de Mue Mpukuta acabou por apresentar a filha ao Rei, para a vida ou para a morte, pois desconhecia ao certo o que viria a acontecer.
E curou-se o Makongo.
Ficou sempre escondida a pequena Mue Nzovo e, quando já mulher feita, Makongo mandou reunir toda a família.
Vieram. E, novamente, em grande fundação, lhes perguntou o Rei:
- Agora, disse o Rei, esperem um pouco e verão o que faço.
No meio de todos mandou colocar esteiras, peles, etc., etc., o que era costume empregar na entronização dos Reis.
Tudo pronto, ao mando do Rei, saiu de um falso sepulcro a rapariga muito bem vestida. Logo que a viram, ficaram envergonhados e assustados.
Baixaram as cabeças.
Makongo, tendo mandado sentar a rapariga no lugar que haviam preparado, colocando-se ele próprio de pé, perguntou:
Tendo repreendido e injuriado os que se lhe recusaram a dar-lhe as filhas, disse-lhes:
- Ficai sabendo que só poderão ficar no meu lugar e a governar as terras de Kakongo os descendentes desta donzela que, de hoje para o futuro, deixando o nome de Mue Nzovo se chamará Mue Menga (Menga=sangue).
E continua a tradição a dizer que Makongo Ma Nsonho Nzovo tinha um filha de nome Muana Nfumu Liumba que veio a casar com Mue Menga.
Dos dois teria nascido Mue Mambu (Liambu, pl. Mambu - questão, querela) que foi a Mãe do Kapita Muenimpolo, único descendente de Mue Mambu e o primeiro Kapita com a autoridade suprema sobre todas as terras e gentes de Kakongo.
2. Versão
Apresenta tudo como na primeira, mas faz descender a pequena, que foi entregue para a cura do Makongo, de Mue Sangu, que não era de sangue real,
Mue Sangu, notando a atitude da família do Rei, ofereceu de boa mente a sua filha dizendo: «basta que o velho Rei fique melhor.»
Mue Sangu ficou também a chamar-se Mue Menga.
E, então, porque é que Muenimpolo não passou a denominar-se Makongo, uma vez que tinha o poder sobre as terras e gentes de Kakongo, e conservou para si e seus descendentes o título de Kapita?
E temos, novamente, de recorrer aos costumes e tradições.
Apresentam duas razões.
1.a Razão
O novo Rei, para ser entronizado e receber o título de Makongo, tinha - e dizem que era condição «sine qua non» - em uma cerimônia, de passar, saltando, por cima de uma sua irmã.
Ora Muenimpolo não tinha irmã alguma nem irmão.
Pela cópia do manuscrito que possuímos, sabe-se que Mue Mambu teve outros filhos, não se mencionando de que sexo, antes de Muenimpolo. Mas como os entregava, para serem amamentados, às suas escravas, estas «como tinham inveios com os filhos de Mue Mambu Matavam todos.» (sic)
Foi preciso que Puinde Mua Buanga, irmão de Mue Mambu, a repreendesse e lhe desse "uma carga de purada até duenceu uma Semana inteiro e disse como voce já está no gravida Se tomar dar mais os seus escravaturas matar já sabes o que voce Suceda.» (sic)
E assim, pois, nasceu Muenimpolo e foi amamentado por sua própria mãe, porque era continuamente vigiada.
E no manuscrito a que aludimos ainda se pode ler:
« ... Puindi Mua Buanga mandava os pessoal vizinhando a irmã para que não dava mais o filho na aqueles escravos a Matar.» (sic)
Teria escapado assim à morte o que veio a ser o Kapita Muenimpolo. Por que não tinha nenhuma irmã, não podendo completar todo o cerimonial, ficou sem poder usar o título de Makongo.
Sendo, porém, descendente de Mue Menga (mãe de Mue Mambu) ficou a governar as terras de Kakongo.
Conhecendo bem a mentalidade destes povos, não custa muito a crer que os directos descendentes de Makongo, procurassem dar a morte aos descendentes de Mue Menga.
Poderiam ter ameaçado Mue Mambu e as escravas. É que, acabada - ou até não começada - a descendência de Mue Menga, o governo voltaria, certamente, para eles.
2.a Razão
Dizem que o Kapita Muenimpolo nunca chegou a tomar o título de Makongo porque o último Makongo não tinha sido enterrado por, depois de morto, ter sido encontrado sem um dedo...
Para fins de feitiçaria, em outros tempos, chegavam a guardar as unhas dos mortos, que deviam ser cortadas sempre, e mesmo a cortar e guardar os dedos...
Por outro lado, se na verdade o último Makongo tinha t ido ou tinha a lepra, nada custa a crer que não só um mas vários dedos lhe hajam caído em vida, quanto mais depois de morto!
Os Reis, Príncipes e ricos senhores eram enterrados mui tardiamente.
Em «portugal em África», 1a Série, pág. 116 do ano de 1896, na crónica das Missões Missão de Lândana - lê-se o seguinte:
«O Rei de Kakongo, que morreu em 1874, só foi enterrado em 1881, quando o seu sucessor por sua vez morreu». Portanto, sete anos passados.
A demora em enterrarem-se os Reis e Príncipes era devida ao muito que se exigia de gastos nessa altura e, portanto, ao muito tempo que era necessário para se conseguir o dinheiro e as coisas para um funeral de grandes senhores.
Qual seria o Rei falecido em 1874 quando morreu o seu sucessor?
Quanto a demoras em enterrar, a falta de unhas, etc., disso vamos encontrar provas. Mas como conciliar nomes e datas com certos factos e com o que vamos citar?
No pequeno estudo sobre Lândana, a que já nos referimos, o P. J. Troesch escreve:
«Em 1870 o último Rei de Kakongo, Dom João Capita Mampolo (Ma Mpolo, Mani Polo, Muene Mpolo, Ki Mpolo, tudo isso vem a ser a mesma coisa), Rei eleito mas nunca coroado, está morto, já faz anos, na capital: Ki Ngele. Dom Pedro Ngime (Gimbi) mu-ana nfumu, filho do Rei e depois Príncipe, é Regente. Porem a susseção pertence por direito tradicional a Muata Bona, sobrinho pela mãi, do falecido Rei.
Como lhe é intredito residir em Ki Ngele, espera em Tandu Nzinzi.
Pois antes do novo tomar posse do trono, o antigo Rei tem de ser enterrado com todas as honras e cerimónias. Esse interro incumbe ao filho, ao Príncipe Gime que entretanto exerce a Regência.
«Compreende-se, escreve em 1873 o Padre Duparquet, que este difere as exéquias o maior tempo possível. É o que está acontecendo.
Dom Pedro Gime as difere continuamente, sob o pretexto de não se lembrar onde colocara as unhas do falecido Rei, o que impede de poder proceder às cerimónias. Ora convém saber que durante todo este tempo as esposas do falecido rei estão obrigadas a guardar a continência a mais absoluta sob pena de serem queimadas vivas assim como o cúmplice. Disso pode avaliar-se a paciência com que estas viuvas, que não são menos de duzentas, esperam pelo interro para poderem nupciar. Já se murmura bastante no reino por esta demora, de sorte que é de esperar que Muata Bona não tarde a ser coroado.»
Assim escreveu e citou, textualmente, o P. Troesch.
E já se podem notar dois factos de que falamos: Muenimpolo, «Rei eleito mas nunca coroado»; demorar o funeral por «não se lembrar onde colocara as unhas do falecido Rei.» Esta demora diz-se que é a pretexto desta falta.
De uma carta de P. Auguard, 1880:
"II y a quinze jours un grand Prince est mort de vieillesse, non loin de Landana. Les épreuves doivent se faire plus ou moins multipliées, selon l'importance du personnage défunt. Déjà depuis 15 jours, quatre esclaves, hommes et femmes, ont été soit empoisonnés, soit enterrés, soit empalés, soit enfim crucifiés sur le tronc énorme des baobab. Cela continuera une année et plus.»
Em «Portugal em África», Janeiro de 1900, o P. Rooney escreve, pág. 436:
«Porém na época da visita dos missionários estava Landana sem Rei: (Lândana fôra visitada, para se saber da possibilidade da fundação de uma Missão, na segunda metade do ano de 1870.) era o tempo do interregno. O último monarcha D. João Capita Mempolo tinha fallecido havia já bastantes annos. Mas segundo o costume do paiz, que é de quasi todas as tribus Africanas, o sobrinho, filho de irmã e não do fallecido Rei, era chamado para suceder-lhe no governo: a este pertencia só o encargo de fazer o enterro solemne de seu pae. D. Pedro Djime, a quem cumpria dirigir os funerais, como primogénito, comprehendeu facilmente a vantagem que podia tirar retardando indefinidamente as cerimónias funebres: fel-o sob pretexto de se haverem perdido as unhas do Rei seu pae, sem as quaes não era lícito de modo algum proceder-se à inhumação. O herdeiro legítimo, Muata Bona, n'estas circunstancias não teve outro remedio senão esperar com paciencia que se effectuassem as exequias legaes, condição sine qua non para a sua sahida de Tandazizi, residencia forçada e pouco agradável para o herdeiro do throno. Seria uma falta contra as instituições e um desacato que chamaria necessariamente a vingança dos feiticos, para não dizer dos feiticeiros, sobre o povo se se começassem as festas da coroação e se o novo monarcha fôsse residir Kinguelé, capital do reino, antes de realisadas todas as exigências das leis tradicionais, até as mais minuciosas, a respeito do enterro do defuncto soberano.»
Temos de admitir uma certa confusão, até de datas, e meada onde se não apanha facilmente a ponta, pelo menos do ano de 1870 a 1883.
Quem morreu em 1870 (1874, segundo citação de «portugal em África») e 1880 (segundo P. Auguard), 1881, segundo a mesma citação do «portugal em África"?
Em 1883 está no poder Ntali-Ntali.
Muenimpolo se morreu em 1870, e é o primeiro Kapita («o último monarcha D. João Capita Mempolo», escreve o P. Rooney) quem foi que morreu em 1880 (ou 1881 ?) uma vez que Ntali-Ntali é o segundo da lista dos Kapitas?
Fala-se em que se esperava o enterro do monarca falecido para que o novo fosse coroado e voltasse ao - Kiengele (ou Kinguele).
Ntali-Ntali teria residido lá? Nada consta.
As insígnias dos Kapitas
Bandeira do Rei do Reino de Kakongo
a) Ngonda podi vioka ntangu ko.
A lua não pode passar à frente do sol.
O marido é mais do que a esposa.
O Rei, mais do que os súbditos.
b) Tata, Mikono:
Livembo liami likele.
Pai (diz o filho), (olha a planície de) Mikono:
Vais ao meu ombro (responde o pai).
c) Nkanda likoko lisakilila mbene.
Bate as palmas (mesmo que seja) inimigo.
O súbdito tem de aceitar o seu Rei, o seu chefe, mesmo que não seja de sua simpatia.
A palma da mão: Escrava do olho do... (à letra).
A mão é uma escrava de seu dono, do corpo, do homem a que pertence. Assim deve ser o súbdito para o seu Rei e senhor.
Resumindo: - O Rei está à frente de todos na mesma proporção em que o sol ultrapassa a lua. E o próprio filho do Rei nada pode sem o pai. Por outro lado, o súbdito está para o rei como a palma da mão está para o homem: é escrava das suas necessidades e vontade. Por isso, o súbdito ainda terá que aceitar o seu Rei, saudá-lo, bater-lhe palmas, mesmo que não seja seu amigo.
Nas mãos do actual Kapita, José António Mandevo, esta bandeira está, praticamente desfeita pelo solale, formiga branca.
2. - Uma Kimpaba onde se encontra gravado o nome de BONZOLA FRANQUE.
No tratado de Simulambuku aparece o nome de Manuel Bonzela Franque, Governador de Porto Rico e Mutamba.
Como terá vindo parar às mãos dos Kapitas esta Kimpaba? É que já a havíamos viste em 1943, nas mãos de André Kapita Sozinho Loemba.
Perguntando, um dia, a um dos velhos de Kakongo quem era Bonzela Franque, foi-me dito:
«Bonzola Franque era um grande de Kakongo e morador em Kiobo. Era um dos da comitiva do Kapita Muenimpolo. Tinha a dignidade de Nguvulo - o primeiro intérprete do Rei. Era ele quem tratava dos negócios do Kapita junto dos europeus, chegando a ir a Luanda tratar de carregamento de escravos.»
Não nos parece. Os Franques são do Reino de Ngoio Que andaram ligados ao tráfico de escravos, não há dúvida.
O que não se encontra é explicação para o facto de se encontrar uma Kimpaba, gravada com o nome de Bonzola Franque, nas mãos dos Kapitas. E é que não apresentam mais nenhuma, quando os outros grandes Senhores têm duas e mais...
A Kimpaba era guardada embrulhada - num pequeno cobertor juntamente com folhas das plantas «Mabata-Bata» e «Malembo-Mpumbo.»
Embrulham-na com estas folhas para que «haja sempre paz e se afugente para longe a guerra», dizem.
3. - Três - pontas de elefante, perfuradas para poderem ser usadas como instrumentos de som.
Podem mandar-se tocar em separado ou em conjunto.
Em separado: Sika nuni, Síka nkazi; Sika Muana - Que toque o esposo; Que toque a esposa; Que toque o filho.
Em conjunto: Sika zimpungi ou Sika bakama: Que toquem os «marfins» ou que toquem as "bakama" (=esposas).
Estas pontas de marfim, insígnias e instrumentos de som - quer as dos Kapitas como as de quaisquer outros grandes senhores - são resguardados, para melhor conservação, por uma espécie de rede, um entrelaçado feito com a fibra de «Iubamba.»
Fig. P 14 - O actual Kapita |
O terceiro teria desaparecido...
4. - A indumentária do Kapita:
a) Uma espécie de carapuço (Kimpene, pl. Bimpene) feito em malha de algodão, 0 algodão é comprado nas feitorias, mas é um indígena quem faz o "Kimpene". Outrora era feito com a fibra de folha de ananás ou da casca de embondeiro.
Nas maiores solenidades, usam um outro mais longo, caindo para um dos lados das orelhas, que tem o nome de Nzita.
b) A Kinzemba (pl. Binzemba), espécie de romeira.
É trabalhada em algodão grosso mas tem uma espécie de borlas, caindo à frente e atrás e dos lados, feitas da fibra muito fina do «Mpusu».
c) À frente, à guisa de avental e sobre o pano-saia (os grandes chefes, sobretudo em cerimónias, nunca traziam calças, pelo menos à vista), usavam a Nkanda Kinfumua pele do chefe, do mando - quase sempre do animal, espécie de lontra, Kingolo Kinhundu.
5. - A cabeça de Mue Mambu, mãe do Kapita Muenimpolo.
Pode ver-se em uma das fotografias que apresentamos.
Admira-nos o cuidado com que é guardada e a simplicidade com que se afirma ser a cabeça de Mue Mambu, quando não pode passar de cabeça de alguma estátua de Ceres ou da Primavera, restos mortais do jardim dum europeu qualquer.
O Kapita André Sozinho Loemba, com os seus companheiros presentes, afirmava ser esta a cabeça de Mue Mambu com uma convicção que a todos deixava pasmados.
E o certo é que o seu sucessor ainda a guarda cuidadosamente!
6. - Pude ver, em 1943, na posse do Kapita Sózinho Loemba, a nossa bandeira monárquica, entregue ao Kapita Ntali-Ntali na altura do tratado do Kinfuma, 1883.
Estava perfeitamente conservada. A cópia, porém, do tratado, segundo me disseram, havia sido destruída pelo tempo e salalé.
Fig. P 15 - O que resta das isignias dos Kapitas com a que dizem ser a "cabeça" de Mue-Mambo. |
A lista dos Makongos e suas insígnias. Makongos de Bumelambuto.
Do que se intitulava «Macongo Mua Tate» recebemos um manuscrito, em 1943 também, onde ele dava a lista dos Makongos.
Vamos transcrevê-la textualmente.
Depois 7.o Macongo Mua Mbeco Depois de Macongo Mua Mbeco Sou em 1939 -E que nomeou o 8.o Macongo Mua Tate Porque a todos Príncipes foi Gerado pelo Príncipe, Macongo.»
O interessante nesta lista é notar que Mua Tate, de quem o velho Estanislau Kimpolo dizia que seria descendente do Makongo Nganga Mvula e não do Ntinu Makongo, apresenta, em 6.o lugar, o Kapita Muenimpolo («Capita Mua NPolo»).
Nesta lista vemos o Makongo Sonho Nzovo em 2.o lugar.
E diz-se, na história dos Kapitas, que foi ele quem tirou o poder aos seus descendentes para o conceder aos de Mue Menga.
Está fora da ordem cronológica ou foi com outro que se deu o facto?
Fig. P 16 - O que se intitula actual Makongo |
As insígnias e indumentárias
a) - Ao centro, temos o mesmo símbolo da bandeira do Kapita: o Rei com o filho aos ombros.
b) -A direita, um homem que se levanta da cama.
Explicação
c) - À esquerda, um leopardo que arremeda comer um cabrito.
Nkomba indevo:
Mvika mue ngó.
O cabrito com barbas:
É escravo do «senhor» leopardo.
Explicação - O aparato exterior de pouco ou nada vale. A «pera» do cabrito não o defende do leopardo. O poder está na pessoa e não no aspecto. O leopardo é um animal real! E simboliza o Rei.
O verdadeiro poder está no Makongo.
d) - À direita, abaixo, a representação da parede-cumeeira de uma casa.
Dangamuna kendala:
Ntelama podi ko.
A parede-cumeeira de uma casa:
Não pode virar-se ao contrário, de bico para baixo.
Explicação - Não se tira o direito a quem o tem, a razão a quem está de posse dela. Não se pode tirar o direito que o «Makongo» tem a ser o primeiro. Não se podem virar as coisas.
Nota - Quando em 1943 já me debruçara sobre este assunto - para saber de que lado estava o direito e a razão, nenhuma bandeira me foi apresentada pelo dito Makongo Mua Tati. E não foi apresentada porque, simplesmente, não existia, assim o disse ele.
Esta, apresentada agora pelo que se diz 9. Makongo, está muito atabalhoadamente feita. Foi imaginada posteriormente?
Mostra ser bastante recente, não haja dúvida.
Fidalgos e Titulares
Os tidos por fidalgos, dignitários e titulares eram, em outros tempos, numerosíssimos.
Basta ler as antigas crónicas e narrações de viagens.
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