A KIMPABA
(pl. BIMPABA)
KIMPABA é uma espécie de cutelo de aparência semelhante à da catana actual. Não é, contudo, usada para os mesmos fins do cutelo ou da catana.
Encontramos BIMPABA em ferro, uma em marfim, sendo a maioria delas em prata e bem trabalhadas.
A KIMPABA deixou de ser instrumento de castigo e de execução da pena capital para ser o símbolo do poder absoluto dos grandes chefes. Acontece até que o gume da KIMPABA não é afiado e nem se iria cortar a cabeça a alguém com cutelo só de prata e muito menos de marfim.
A. J. Fernandes, de Cabinda, define a KIMPABA deste modo: «É, pois a Tximpaba, quase sempre de prata, trabalhada em forma de espátula, tendo num dos lados laterais umas três ou quatro cavidades, deixando nos espaços uns dentes de forma irregular; na parte estreita tem um punho ou cabo, igualmente de prata.
«Os Cabindas ainda hoje a usam em suas pomposas cerimónias públicas e em certos e determinados actos de sua vida particular, como símbolo de absoluto e máximo respeito onde quer que ela seja exibida.»
Raros eram os grandes Chefes - «Bafumu-Bansi» - que não possuíam uma KIMPABA em prata, pelo menos.
Muitos as venderam já - todas ou em parte - e, por isso, se vão tornando mais raras, posto que se possa ainda encontrar uma boa dúzia delas.
Quando um grande chefe era convidado para assistir a alguma cerimónia pública, fazia-se acompanhar de um Nkotokuanda (que de advogado ou orador, ordinariamente, fazia agora de secretário ou de ajudante de campo.) que era o portador da KIMPABA.
No local da reunião cada chefe tinha lugar reservado e segundo a dignidade de cada um. Ao centro, o mais digno. A frente de cada um desses chefes era preparado o lugar para a respectiva insígnia do poder, a KIMPABA. Um «luando» - esteira grossa de papirotendo por cima uma «nkuala» - esteira fina - e um fino, mas pequeno, tapete, era onde repousaria a Kimpaba de cada Nfumu-Nsi.
Quando o Nfumu-Nsi, por doença ou outro motivo grave e aceite não comparecia, era substituído pelo seu Nkotokuanda, que tomava o lugar do chefe colocando à sua frente a KIMPABA de quem representava.
Era rara sair para fora de suas terras a KIMPABA do Rei MAKONGO ou do Rei MANGOIO. Mas, quando isto acontecia, a corte nomeava uma deputação chefiada por um Kapita ou por um Mangovo. Os membros destas deputações eram transportadas em tipoia, como se do próprio Makongo ou Mangoio se tratasse.
Em campo de batalha, a presença da KIMPABA de uma entidade superior à dos dois contendores obrigava ao cessar imediato da luta.
Esta atitude dos beligerantes perante a KIMPABA do Rei ou de um grande senhor, faz lembrar o medo do Senhor de Aratta quando viu o ceptro do herói sumério Enmerkar. Lê-se em «A História começa na Suméria», por Samuel Noah Kramer, o que se encontrou escrito, em escritura cuneiforme, numa placa de argila de há uns 4.000 anos: «...Envia uma vez mais o arauto a Aratta, mas agora, em vez de urna mensagem, o arauto empunha o próprio ceptro de Enmerkar. Ver o ceptro parece ter suscitado o terror do senhor de Aratta.» (Samuel Noah Kramer, «A História Começa na Suméria», publicações Europa América, 1963, pág. 41.)
É que, entre Bakongo e Bauoio, a KIMPABA fazia as vezes de ceptro.
O portador da KIMPABA, que não era necessàriamente o dono dela, mas sempre alguém, pelo menos, enviado pelo senhor da KIMPABA, apresentava as razões que ali o traziam e as propostas de quem o enviava. Era um embaixador da paz.
Se aceitavam as propostas a luta no campo era dada por finda e depois, em grande «fundação», procuravase resolver o assunto a contento das duas partes.
Mas se, por acaso, desrespeitavam a KIMPABA da autoridade que ali viera propor a paz, e nem sequer deixavam de combater por momentos para ouvir o embaixador, terminada a batalha, levasse o tempo que levasse, eram os chefes dos contendores chamados a «fundação» para se saber da culpabilidade naquela falta de respeito.
O caso era muito sério. Bem pesadas seriam as custas para o culpado ou culpados dessa grave falta.
Anda na memória das gentes de Kakongo a célebre luta entre os do Tenda e do Muba.
Mabuba era obrigado a parar a luta logo que visse o Matenda, ou seu embaixador, com a KIMPABA ou com o Mbondo-fula.
Não viu. Não soube o que o seu adversário propunha. Por isso, acabou por queimar o Tenda.
Podia alguém ter um devedor. Esgotara todos os meios pacíficos e persuasivos para reaver o que era seu. Consulta, então, um advogado, um Nkotokuanda, Era ao Nkotokuanda que se confiava a cobrança das dívidas.
O Nkotokuanda pede à autoridade, que é, ordinariamente, o seu próprio chefe, a respectiva KIMPABA - que nunca era cedida gratuitamente - e, munido dela, vai a casa do devedor.
Este, antes de mais nada, teria de arranjar imediatamente lugar digno para se colocar a KIMPABA.
O Nkotokuanda apresentava, depois, a razão que ali o trazia.
Expostos os motivos e as razões de parte a parte (o credor, quase sempre, faz-se representar) as duas partes vão para o nkoto, lugar onde podem trocar palavras em particular, depois de pedida autorização ao Nkotokuanda.
Combinam, concordam ou não. Em termos respeitosos dizem o que foi combinado, se houve ou não acordo.
Pode haver recusa ou aceitação da dívida.
Mas, de modo algum se pode admitir a mais leve falta de respeito à Kimpaba, que o mesmo é desrespeitar a autoridade que representa. Se assim acontecesse, quem desrespeitou será chamado a tribunal e sofrerá as consequências.
De regresso, o Nkotokuanda colocava a autoridade a quem pertencia a KIMPABA a par de tudo o que acontecera e se resolvera.
No caso do tido por devedor não aceitar a dívida, o que se julgava credor podia levá-lo para «fundação», o Nfunda-Nkanu.
A falta de respeito à KIMPABA nunca era justificável e, portanto, a multa era sempre de aplicar e o condenado nada mais tinha a fazer do que pagar, Nada lhe valeria apelar. A apelação, nestes casos, nunca era aceite. O próprio dono da KIMPABA desrespeitada tornava-se o juiz e sentenciava o que lhe tinha de pagar pelo insulto. Por isso, estas faltas eram muitíssimo raras. Custavam muito, muito caro!...
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