quinta-feira, 24 de maio de 2012

Quem é Exu? (parte 2)

Exú por  Alessandro Coi
Segunda parte

Nos anos (18)40 e (18)50 foi constante a referência, nas páginas dos jornais do Rio de Janeiro e São Paulo, de reuniões de pretos (nomes dos negros de então), com finalidade aparente de praticar a religião. Tais reuniões, quando descobertas ou denunciadas, eram dissolvidas a pata de cavalo ou a golpe de bastões policiais, sendo seus praticantes recolhidos presos, quando não logravam fugir.

A partir dos anos (18)50, é nítida a separação de semelhantes “pagodes”, sempre destruídos, em duas famílias, o Candombe ou Candomblé e a Macumba ou Imbanda. Aparece, portanto, pela primeira vez (1853) a Nbandla bantu como ramo independente das religiões ou “cultos” afro-brasileiros.

Quanto ao nome de “pagodes”, eram dados por deboche pelas autoridades policiais, em virtude do caráter enfeitado e complicado dos rituais e dos instrumentos de culto ali evidenciados. Os objetos eram recolhidos ou ali mesmos destruídos.

A Nbandla foi assim uma ideologia social de importância nas condições do século XIX, em função do grande número de componentes dos povos Bantu, que na realidade sócio-cultural de então conformavam as populações locais brasileiras. No que se refere às aproximações com outras religiões, a destruição massiva dos elementos de culto e dos rituais eliminou a possibilidade de uma reconstituição dos caminhos culturais percorridos.

No entorno da Guerra do Paraguai (1860-1880), a `Nbandla sofreu forte impacto do Kardecismo, recém-implantado no Brasil e muito forte então no corpo de oficiais do exército e da marinha. A `Nbandla, sendo já à época conhecida como Umbanda (corruptela gerada pela pronúncia), no Rio de Janeiro tinha mesmo acesso às igrejas católicas onde concentravam as tropas que eram enviadas para o “front” paraguaio. Era então nítida a associação das cores das nações africanas, na escolha dos santos católicos que deviam favorecer os iniciados ou adotados pela Umbanda.

Os cânticos (ou “pontos”) expressam assim uma parte congelada das relações religiosas inter-étnicas, que necessitariam para ser corretamente datados de – ao menos uma preservação de amostras da estatuária sagrada ao longo das gerações. Dessa, ainda hoje – o pouco que resta se encontra nas mãos da polícia. Por isso, torna-se muito difícil chegar à definição dos lugares específicos das identidades religiosas (*dai o distânciamento dos Jinkisi, e conseqüente absorção dos Orixás no culto, mais conservado pela maior visibilidade de alguns terreiros com raízes Yorubas), com uma teoria adequada do papel das identidades eventualmente duplas ou triplas, nas fases históricas precedentes (da época contemporânea). A multiplicidade de papéis a desempenhar que se gera naturalmente numa sociedade em urbanização devia requerer oportunidades também múltiplas de transformação religiosa nos contextos étnico-sociais de então (*Nagotização).

No culto Bantu, a tenda pode atender coletiva ou individualmente. Os dias de atendimento eram coletivos geralmente às segundas e às sextas, sendo os demais dias – todos ou parte deles – dedicados a atendimentos individuais e à “prática da caridade”.


 Mas e Exú? Se perdeu em alguma encruzilhada?

Claro que não, como Senhor dos Caminhos estava abrindo as portas da religião para o novo que surgia com o advento da abolição da escravatura e da nova situação do Brasil, que deixaria de ser mera propriedade de Portugal, assim como os escravos de seus senhores, e passaria, a ser uma nação independente que construiria a partir de então, identidade própria..

O atendimento coletivo substituía a antiga roda comum de delírio das aldeias Bantu na África (Ku Yinga). Ali podia-se entoar cânticos reelaborados para expressar a nova coletividade, evidentemente híbrida, de parentela e consangüinidade desconhecidas. Os antepassados eram invocados de acordo com uma nova terminologia mais abrangente,produzida pelos sacerdotes para cobrir um arco mais abstrato de relações com os fiéis. Nesse sentido, pode-se observar um deslocamento do outro mundo próximo para o outro mundo distante. A necessidade de generalizar as relações de parentesco para todos os Bantu e não-Bantu agora (então) desaldeiados levou à mitologia das Sete Linhas, cujas cores incorporam diferentes culturas e escolhas africanas. Constituiu-se assim nova hierarquia geopolítica da vida espiritual, para corresponder aos movimentos populacionais devidos à guerra, ao recuo da escravidão e ao avanço urbanizador.


Bibliografia
África, mitos y leyendas - Alice Webner
Traduzido por Mametu Ndenge Mutarerê

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