O
Olórí Epé (Chefe de Epé) foi aos awo (adivinhos) no dia em que sua
aldeia estava sendo assolada por um ekùn (Leopardo). O ekùn estava
matando crianças e nenhum dos caçadores
tinham sido bem sucedidos em seus esforços para capturar o animal. A
Adivinhação foi feita, e os Òrìsà disseram que Olórí deve ser gentil
com um forasteiro.
Mais
tarde naquele dia o Okùrin wèrè Ijèbú (homem louco de Ijèbú) se
aproximou da aldeia de Epé. Chamavam-lhe de Okùrin wèrè Ijèbú porque ele
foi criado na floresta, e não tinha nenhuma familiaridade com as
maneiras do mundo. Sua loucura nascia de ìwá-mímó (inocência).
Foi
o Olórí que ofereceu a Okùrin wèrè Ijèbú sopa doce quando se sentou
para descansar perto da entrada da vila. Depois de terminar sua refeição
Okùrin wèrè Ijèbú agradeceu Olórí e continuou sua jornada. Enquanto
estava parado notou que as pessoas da aldeia estavam de luto. Okúrin
wèrè Ijèbú nunca tinha visto tanta tristeza e dor.
"Por que ninguém está cantando ou dançando?" perguntou.
O
Olóría olhou a Okùrin wèrè Ijèbú e não pensou nem por um minuto que ele
era a pessoa que salvaria sua aldeia. "Fomos atingidos por um ekún que
está atacando nossas crianças", ele disse isso enquanto olhava para a
estrada na esperança de ver outro estrangeiro.
"Como
você foi tão bom para mim, salvarei sua gente do Epé, desta terrível
ameaça". Okùrin wèrè Ijèbú bateu as palmas mãos, como se o assunto já
tivesse sido resolvido.
“Você é um Ode (caçador)?" perguntou o Olórí.
Não sabendo o que era um Ode, Okùrin wèrè Ijèbu respondeu "Sim".
"Porem não tinha armas". O Olórí não estava convencido.
Tendo
sido criado na pobreza, Okùrin wèrè Ijèbú estava acostumado a lidar.
Ele pegou um pilão, que estava ao lado da argamassa usada para bater
inhame. "Agora eu estou pronto para caçar esse ekùn que tem causado
tanta infelicidade".
O Olórí balançou a cabeça e orou ao Òrìsà, pedindo-lhes para enviar um verdadeiro Ode à vila da Epé.
Enquanto
Okùrin wèrè Ijèbú estavam indo para a floresta, ele ouviu as pessoas de
Epè gritando que o ekùn estava vindo. Ele rapidamente subiu em uma
árvore e esperou passar o ekùn. O ekùn caminhou diretamente sob Okùrin
wèrè Ijèbú, que caiu da árvore quando viu os dentes da besta selvagem.
Antes de bater no chão, deixou cair o pilão que pousou diretamente sobre
a cabeça do ekùn. O animal foi morto com um único golpe.
Imediatamente
as pessoas de Epé começaram a dançar e cantar. Estavam agradecendo
Okùrin wèrè Ijèbú. Foi nessa ocasião que o povo de Epé decidiu dar a
Okùrin wèrè Ijèbú um nome justo. E assim ele se ficou conhecido como
Sàngó (Espírito do relampago).
Comentário:
Sàngó é uma das figuras centrais nas histórias dos Òrìsà que falam de
transformação espiritual. Ifá é uma religião que se baseia no princípio
de desenvolvimento do poder pessoal. De um ponto de vista psicológico, o
poder pessoal cresce através do processo de superação do medo. Esta
história é um exemplo dessas forças psicológicas que entram em jogo toda
vez que enfrentamos um medo.
O
Okùrín wèrè Ijèbú (homem louco de Ijèbú) caracteriza-se como inocente e
ingênuo. A inocência e ingenuidade são a norma para quem começa uma
busca espiritual. Nas tradições místicas Européias o papel do louco é
geralmente descrito como "tonto". Esta caracterização não se destina a
reduzir a figura central na história. Ao contrario, aponta para uma
verdade fundamental que ocorre em qualquer momento, quando o medo é
confrontado por ação direta.
Quando
somos crianças muito jovens não temos medo de atravessar a rua. É
somente quando a criança começa a interagir com outras pessoas que
desenvolve um medo ou temor. A fonte do medo é a reação dos adultos que
vêem uma criança tentando atravessar a rua sozinha. Muitas ruas
movimentadas merecem cautela, mas para uma criança pequena não há base
para a avaliação.
Na
história, Sàngó está disposto a caçar o leopardo porque não tem ideia
de como o animal pode ser maligno. Sempre que enfrentar um medo novo a
mesma falta de informação é um fator. A única maneira de enfrentar o
medo é através da coragem, e a única maneira de acessar a coragem é agir
apesar do medo. A alternativa é a de continuar a manter o medo.
A disposição de Sàngó para enfrentar um desafio desconhecido,
sendo bem sucedido mesmo que os meios para tanto parecam acidentais.
Uma vez que Sàngó realmente matou o leopardo, tem informações em
primeira mão sobre os perigos da vida real que estão envolvidos. É esse
conhecimento que permite Sàngó tornar-se um guerreiro consumado.
Em
histórias posteriores da vida de Sàngó sua habilidade na batalha
eleva-o à posição de tornar-se o protótipo para a fonte da coragem
heróica, tal como ele existe como uma força da natureza.
Simplesmente
Sàngó se torna a personificação da coragem, e esta história é o
fundamento da sua missão para descobrir o awo, o mistério da ação
corajosa.
Awo Ifádámiláre
http://www.ifaolokun.com.br
Ifá é quem transforma as coisas ruins em boas