segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Òrìsà Orí


Luiz Carlos Teixeira de Oliveira
(ori'nu ogunsina)


Para termos idéia quanto a importância e precedência do ORÍ em relação aos demais ORISA, um Itan do ODU OTURA MEJI, ao contar a história de um ORÍ que se perdeu no caminho que o conduzia do ORUN para o AIYE, relata: "... OGUN chamou ORÍ e perguntou-lhe, "Você não sabe que você é o mais velho entre os ORISA? Que você é o líder dos ORISA?'..." . Sem receio podemos dizer, "ORÍ mi a ba bo ki a to bo ORISA", ou seja, "Meu ORÍ, que tem que ser cultuado antes que o ORISA" e temos um oriki dedicado à ORÍ que nos fala que "Ko si ORISA ti da nigbe leyin ORI eni", significando, "... Não existe um ORISA que apoie mais o homem do que o seu próprio ORÍ...".

Quando encontramos uma pessoa que, apesar de enfrentar na vida uma série de dificuldades relacionadas a ações negativas ou maldade de outras pessoas, continua encontrando recursos internos, força interior extraordinária, que lhe permitam a sobrevivência e, inclusive, muitas vezes, mantém resultados adequados de realização na vida , podemos dizer, "ENIYAN KO FE KI ERU FI ASO, ORI ENI NI SO NI", ou seja, "as pessoas não querem que você sobreviva, mas o seu
ORÍ trabalha para você", trazendo, essa expressão, um indicador muito importante de que um ORÍ resistente e forte é capaz de cuidar do homem e garantir-lhe a sobrevivência social e as relações com a vida, apesar das dificuldades que ele enfrente.

Esta é a razão pela qual o BORI, forma de louvação e fortalecimento do ORÍ utilizada em nossa religião, é utilizado muitas vezes, precedendo ou, até, substituindo um EBO. Isso se faz para que a pessoa encontre recursos internos adequados, esta força interior de que falamos, seja à adequação ou ajustamento de suas condições frente às situações enfrentadas, seja quanto ao fortalecimento de suas reservas de energia e consequente integração com suas fontes de vitalidade.

É importante dizer que é o
ORÍ que nos individualiza e, por consequência, nos diferencia dos demais habitantes do mundo. Essa diferenciação é de natureza interna e nada no plano das aparências físicas nos permite qualquer referencial de identificação dessas diferenças. Sinalizando essa condição, talvez uma das maiores lições que possamos receber com respeito a ORÍ possa ser extraída do Itan ODU OSA MEJI, que reproduzimos a seguir e que é a resposta que foi dada por IFA para Mobowu, esposa de OGUN, quando ela foi lhe consultar:



"
ORÍ buruku ki i wu tuulu.
A ki i da ese
asiweree mo loju-ona.
A ki i m'
ORÍ oloye lawujo.
A dia fun Mobowu
Ti i se obinrin Ogun.
ORÍ ti o joba lola,
Enikan o mo

Ki toko-taya o mo
pe'raa won ni were mo.
ORÍ ti o joba lola,
Enikan o mo.
"

TRADUÇÃO


"Uma pessoa de mau
ORÍ não nasce com a cabeça diferente das outras.
Ninguém consegue distinguir os passos do louco na rua.
Uma pessoa que é líder não é diferente
E também é difícil de ser reconhecida.
É o que foi dito à Mobowu, esposa de OGUN, que foi consultar IFA.
Tanto esposo como esposa não deviam se maltratar tanto,
Nem fisicamente, nem espiritualmente.
O motivo é que o
ORÍ vai ser coroado
E ninguém sabe como será o futuro da pessoa."

Para os yoruba o ser humano é constituído dos seguintes elementos:
ARA, OJIJI, OKAN, EMI e ORÍ.
ARA é corpo físico, a casa ou templo dos demais componentes.
OJIJI é o "fantasma" humano, é a representação visível da essência espiritual.
OKAN é o coração físico, sede da inteligência, do pensamento e da ação.
EMI, [1] está associado a respiração, é o sopro divino.
Quando um homem morre, diz-se que seu EMI partiu.

ORÍ é o ORISA pessoal, em toda a sua força e grandeza. ORÍ é o primeiro ORISA a ser louvado, representação particular da existência individualizada (a essência real do ser). É aquele que guia, acompanha e ajuda a pessoa desde antes do nascimento, durante toda vida e após a morte, referenciando sua caminhada e a assistindo no cumprimento de seu destino.

ORÍ em yoruba tem muitos significados - o sentido literal é cabeça física, símbolo da cabeça interior (ORÍ Inu). [Transcentetalmente, tudo que espiritualmente é superior e está acima do ser humano (llm)]

Enquanto ORISA pessoal de cada ser humano, com certeza ele está mais interessado na realização e na felicidade de cada homem do que qualquer outro ORISA. Da mesma forma, mais do que qualquer um, ele conhece as necessidades de cada homem em sua caminhada pela vida e, nos acertos e desacertos de cada um, tem os recursos adequados e todos os indicadores que permitem a reorganização dos sistemas pessoais referentes a cada ser humano. Reforçando esta questão temos um oriki que nos diz

"
ORÍ lo nda eni
Esi ondaye ORISA lo npa eni da
O npa ORISA da
ORISA lo pa nida
Bi isu won sun
Aye ma pa temi da
Ki
ORÍ mi ma se ORÍ
Ki ORÍ
mi ma gba abodi"

TRADUÇÃO


"
ORÍ é o criador de todas as coisas
ORÍ é que faz tudo acontecer, antes da vida começar
É ORISA que pode mudar o homem
Ninguém consegue mudar ORISA
ORISA que muda a vida do homem como inhame assado
AYE*, não mude o meu destino
Para que o meu
ORÍ não deixe que as pessoas me desrespeitem
Que o meu
ORÍ não me deixe ser desrespeitado por ninguém
Meu
ORÍ, não aceite o mal."
(* AYE - conjunto das forças do bem e do mal)

Como foi dito, não existe um ORISA que apoie mais o homem do que o seu próprio
ORÍ.
Um trecho do adura (reza) feito durante o assentamento de um IGBA-ORÍ diz:

"KORIKORI,

Que com o ase
do próprio ORÍ,
O
ORÍ vai sobreviver
KOROKORO

Da mesma forma que o
ORÍ de Afuwape sobreviveu,
O seu sobreviverá.
...Ele será favorável a você.
Tudo de que você precisa,
Tudo o que você quer para a sua vida,
É ao seu
ORÍ que você deverá pedir.
É o
ORÍ do homem que ouve o seu sofrimento..."

O que é então
ORÍ, de que a natureza é constituído e qual o seu papel na vida do homem? Em primeiro lugar, acredita-se que o corpo humano é constituído de duas partes: a cabeça e o suporte - ORÍ e APERE.
Acredita-se que este corpo adquire existência na medida em que recebe de OLODUNMARE o sopro vivificador - o EMI.[2]

Este sopro foi o agente do processo da criação em seu primeiro momento e tem sido o responsável pela geração e continuidade de toda a vida no universo.

Este modelo descrito e de entendimento abrangente para todas as formas de vida é repetido no ser humano. A cabeça e o seu suporte, ORI-APERE são formados a partir dos elementos matrizes, enquanto o ORI-INU, interior, representa, na sua constituição, uma combinação de elementos, porções de matéria-massa que é particularizada durante o processo de modelagem de cada
ORÍ. Ele é único e, por conta disso, particulariza e dá individualização à existência.
Essa combinação "química" definirá parte das relações do homem com o mundo sobrenatural e a religião, na medida em que determina o seu ELEDA, ORISA - símbolo do elemento cósmico de formação, a que chamamos, adiante, de IPORI, daquele ORI-INU em particular.

No Brasil vimos, com certa frequência, o ELEDA ser chamado de ORISA-ORI, simplificação da relação aqui exposta. ELEDA segundo Juana Elbein dos Santos em Os Nagô e a Morte, "se refere à entidade sobrenatural, à matéria-massa que desprendeu uma porção da mesma para criar um
ORÍ, consequentemente Criador de cabeças individuais..."

Segundo a autora , "A espécie de material com o qual são modelados os
ORÍ individuais indicará que tipo de trabalho é mais conveniente, proporcionando satisfação e permitindo a cada um alcançar prosperidade. Indica também as interdições - EWO - aquilo que lhe é proibido comer, por causa do elemento com o qual o seu ORÍ foi modelado".

Ou seja, os EWO
representam a proibição de que o indivíduo "coma" alimentos que contenham a mesma "matéria" da qual foi retirada uma porção para modelagem do seu ORÍ. A não observância da interdição traduz-se por uma disfunção energética de consequências profundamente negativas para o equilíbrio do indivíduo, seja do ponto de vista orgânico, seja do ponto de vista do mundo emocional, seja quanto as suas condições de realização do "programa" particular de existência.

Falamos até aqui sobre a natureza e a constituição do
ORÍ. Agora, qual o seu papel na vida do homem?
O conceito de ORÍ está intimamente ligado ao conceito de destino pessoal e à instrumentalização do homem para a realização deste destino. Um Itan do ODU OGUNDA MEJI, nos dá a exata dimensão da matéria quando nos relata sobre a correspondência entre o ORÍ e o homem e a relação de causa e efeito existente nesta correspondência:

"...
ORÍ, eu te saúdo!
Aquele que é sábio,
Foi feito sábio pelo próprio
ORÍ.
Aquele que é tolo,
Foi feito mais tolo que um pedaço de inhame,
Pelo próprio
ORÍ..."

No ODU OGBEYONU (Ogbe Ogunda) vamos encontrar ainda, "...Quando acordo pela manhã coloco minha mão no
ORÍ. ORÍ é fonte de sorte. ORÍ é ORÍ!...". e um oriki dedicado à ORÍ, mostrando o papel que ORÍ tem na vida de cada pessoa quanto as suas relações interpessoais, suas relações com as outras pessoas, e as suas condições de realização e progresso em todos os empreendimentos da vida, nos diz:

"ORI mi
Mo ke pe o
o
ORI mi
A pe je

ORI mi
Wa je
mi o
Ki ndi olowo o
Ki ndi olola
Ki ndi eni a pe sin
Laye
O, ORI mi
Lori a jiki
ORI mi lori a ji yo mo
Laye"

TRADUÇÃO

"Meu
ORÍ
Eu grito chamando por você
Meu
ORÍ,
Me responda
Meu
ORÍ,
Venha me atender
Para que eu seja uma pessoa rica e próspera
Para que eu seja uma pessoa a quem todos respeitem
Oh, meu
ORÍ!
A ser louvado pela manhã,
Que todos encontrem alegria comigo"

Toda existência no universo da Criação se processa em dois planos: O mundo visível, o AIYE, universo concreto que habitamos, e o mundo invisível, ORUN, onde habitam os seres sobrenaturais e os " duplos" de tudo o que se encontra manifestado no AIYE. Não são, como é possível pensar, mundos independentes ou rigidamente separados. Na realidade podemos afirmar que o AIYE é, antes de mais nada, uma "projeção" da realidade essencial que tem existência e se processa no ORUN.

Como diz a Profa. Dra. Iyakemi Ribeiro, em seu livro "Alma Africana no Brasil: os iorubás", "Para o negro-africano o visível constitui manifestação do invisível. Para além das aparências encontra-se a realidade, o sentido, o ser que através das aparências se manifesta. Sob toda manifestação viva reside uma força vital: de Deus a um grão de areia, o universo africano é sem costura. (Erny, 1968:19) Universo de correspondências, analogias e interações, no qual o homem e todos os demais seres constituem uma única rede de forças."

É necessário entender, assim, que AIYE e ORUN constituem uma unidade e, enquanto expressões de dois níveis de existência, são inseparáveis e complementares. Essa unidade é simbolizada pelo IGBA-ODU, cabaça formada de duas metades unidas onde a parte inferior representa o AIYE e a parte superior representa o ORUN. No interior, os "elementos indispensáveis à existência individualizada". Poderia ser representada por uma figura e sua imagem refletida no espelho - há plena identidade entre elas, uma é apenas a imagem invertida da outra.

Podemos dizer nessa figuração que o AIYE é a imagem refletida do ORUN. Essa analogia provavelmente explica a situação conhecida de que os ODU, quando vieram do ORUN para o AIYE, tiveram sua ordem de precedência invertida. Ou seja, muito embora no AIYE considere-se OGBE MEJI como o mais antigo dos ODU, todo Babalawo saúda OFUN MEJI, ou ORANGUN MEJI como é também conhecido, em sua realeza, dizendo: eepa ODU!, louvando assim sua antiguidade e sua precedência efetiva.

Temos assim que toda existência no AIYE reflete uma realidade anterior existente no ORUN. A existência no AIYE implica em processar-se uma "modelagem" anterior no ORUN, a partir da qual porções de matérias-massas que constituem a base da existência genérica são tomadas em fragmentos particulares e vão constituir a manifestação dessa existência em forma individualizada no AIYE.

Esses elementos matrizes possuem, por consequência, dupla existência: uma parcela presente no ORUN e a outra parcela dando vitalidade ou formação às diferentes partes que formam a "realidade" individualizada de vida. A esses fragmentos particulares retirados da massa genitora chamamos IPORI e é ele, IPORI, que determinará o ORISA que cada indivíduo cultuará no AIYE, condicionando também sua instrumentalização particular na relação com a vida e o repertório possível de escolhas que possa realizar.

Aqui é importante reforçarmos que ORUN não tem o mesmo significado que céu, assim como AIYE não tem a mesma representação que terra. ORUN - AIYE nos trazem conceitos muito diferentes do binômio céu - terra a que possamos ter nos acostumado pelas condições sincréticas que a religião dos ORISA terminou por apresentar no Brasil. Ao par céu - terra correspondem os conceitos de SANMO
- ILE.

A RESPEITO DO DESTINO HUMANO [3]

Podemos perceber que a compreensão sobre o papel que
ORÍ desempenha na vida de cada homem está intimamente relacionado à crença na predestinação - na aceitação de que o sucesso ou o insucesso de um homem depende em larga escala do destino pessoal que ele traz na vinda do ORUN para o AIYE. A esse destino pessoal chamamos KADARA ou IPIN e é entendido que o homem o recebe no mesmo momento em que escolhe livremente o ORÍ com que vai vir para a terra.

ORÍ desempenha um papel importante para os seguidores de IFA. Nele acredita-se que escolhemos nossos próprios destinos. E nós o fazemos mediante os auspícios do ORISA IJALA MOPIN. A esfera de ação de IJALA é junto a OLODUNMARE e é ele que sanciona as escolhas de destino que fazemos. Essas escolhas são documentadas pelas divindades que chamamos de ALUDUNDUN. Um verso de IFA [do Odu Ogbe-Ogunda] explica esta questão:

"Você disse que foi apanhar o seu
ORÍ.
Você sabia onde Afuwape apanhou o seu
ORÍ?
Você poderia ter ido lá para apanhar o seu.
Nós pegamos nossos
ORÍ nos domínios de IJALA,
Assim somente nossos destinos diferem"

IJALA é responsável pela modelação da cabeça humana, e acredita-se que o
ORÍ e o ODU - signo regente de seu destino que escolhemos, determina nossa fortuna ou atribulações na vida, como foi dito.
IJALA, embora notável em sua habilidade, não é muito responsável e, por isso, muitas vezes modela cabeças defeituosas: pode esquecer de colocar alguns acabamentos ou detalhes desnecessários, como pode, ao levá-las ao forno para queimar, deixá-las por um tempo demasiado ou insuficiente.

Tais cabeças tornam-se assim, potencialmente fracas, incapazes de empreender a longa jornada para a terra, sem prejuízos. Se, desafortunadamente, um homem escolhe uma dessas cabeças mal modeladas, estará destinando a fracassar na vida.

Durante sua jornada para a terra, a cabeça que permaneceu por tempo insuficiente ou demasiado no forno, poderá não resistir à ação de uma chuva forte e chegará mais danificada ainda. Todo o esforço empreendido para obter sucesso na vida terrena terá grande parte de seus efeitos desviada para reparar tais estragos.

Pelo contrário, se um homem tem a sorte de escolher uma das cabeças realmente boas, tornar-se próspero e bem sucedido na terra, uma vez que sua cabeça chega intacta e seus esforços redundam em construção real de tudo aquilo que se proponha a realizar.

O trabalho árduo trará, ao homem afortunado em sua escolha, excelentes resultados, já que nada é necessário dispender para reparar a própria cabeça. Assim, para usufruir o sucesso potencial que a escolha de um bom ORI acarreta, o homem deve trabalhar arduamente. Aqueles, entretanto que escolheram um mau ORI têm poucas esperanças de progresso, ainda que passem o tempo todo se esforçando.

Sendo estes os pressupostos, retomamos as perguntas: Como saber se a escolha do próprio
ORÍ foi boa ou má? Pode um homem conhecer as potencialidades da própria cabeça ou da cabeça de outrem?

O Jogo divinatório de IFA possibilita que a pessoa tome conhecimento dos desígnios do próprio
ORÍ, saiba a respeito do ORISA ou IRUNMALE que deve ser cultuado e conheça seus EWO - proibições quanto ao consumo de alimentos, uso de cores e condutas morais.

Muitas referências são feitas às relações entre
ORÍ e o destino pessoal. O destino descrito como IPIN ORI - a sina do ORI - pode ser dividido em três partes: AKUNLEYAN, AKUNLEGBA E AYANMO.

AKUNLEYAN é o pedido que você fez no domínio de IJALA - o que você gostaria especificamente durante seu período de vida na terra: o número de anos que você desejaria passar na terra, os tipos de sucesso que você espera obter, os tipos de parentes que você deseja.

AKUNLEGBA são aquelas coisas dadas a um indivíduo para ajudá-lo a realizar esses desejos. Por exemplo: uma criança que deseja morrer na infância pode nascer durante uma epidemia para garantir a morte dele ou dela.

AYANMO
é aquela parte do nosso destino que não pode ser mudada: nosso gênero (sexo) ou a família em que nascemos, por exemplo.

Ambos, AKUNLEYAN e AKUNLEGBA podem ser alterados ou modificados quer para bom ou para mau, dependendo das circunstâncias.

Assim o destino descrito como IPIN
ORÍ - a sina do ORÍ pode sofrer alterações em decorrência da ação de pessoas más chamadas como ARAYE - filhos do mundo, também chamadas AIYE - o mundo ou ainda, ELENINI - implacáveis (amargos, sádicos, inexoráveis) inimigos das pessoas.

Entre estes encontram-se as AJE
- bruxas, os OSO - feiticeiros, os envenenadores e todos aqueles que se dedicam a práticas malignas com intuito de estragar qualquer oportunidade de sucesso humano.

Sacrifício e ritual podem ajudar a melhorar as condições desfavoráveis que podem ter resultados destas maquinações maléficas imprevisíveis.

Todo
ORÍ, embora criado bom, acha-se sujeito a mudanças. Vimos que feiticeiros, bruxas, homens maus e a própria conduta podem transformar negativamente um ORÍ, sendo sinal dessa transformação uma cadeia interminável de infelicidades na vida de um homem a despeito de seus esforços para melhorar.

O
ORÍ, entidade parcialmente independente, considerado uma divindade em si próprio, é cultuado entre outras divindades, recebendo oferendas e orações. Quando ORÍ INU está bem, todo o ser do homem está em boas condições.

Como foi dito, nossos
ORÍespirituais são por eles mesmos subdivididos em dois elementos:  
APARI-INU = representa o caráter (natureza),
ORÍ APERE = representa o destino.

Um indivíduo pode vir para a terra com um destino maravilhoso, mas se ele ou ela vem com mau caráter (natureza), a probabilidade de desempenho (cumprimento, execução) desse destino é severamente comprometida.

O destino também pode ser afetado, então, pelo caráter da própria pessoa. Um bom destino deve ser sustentado por um bom caráter.

Este é como uma divindade: se bem cultuado concede sua proteção. Assim, o destino humano pode ser arruinado pela ação do homem. IWA RE
LAYE YII NI YOO DA O LEJO, ou seja, - "Seu caráter, na terra, proferirá sentença contra você".

No ODU de OGBEOGUNDA, IFA diz:

"Um pilão realiza três funções
Ele tritura inhame
Ele tritura índigo
Ele é usado como uma tranca atrás da porta
Foi feito um jogo adivinhatório para Oriseku,
ORÍ-Elemere e Afuwape
Quando eles foram escolher seus destinos nos domínios de IJALA - MOPIN
Foi solicitado para eles que realizassem rituais
Somente Afuwape realizou os rituais que foram solicitados
Ele, em consequência, tornou-se muito afortunado

Os outros lamentaram, disseram que se soubessem onde Afuwape escolheria seu
ORÍ, eles teriam ido até lá para escolher os seus também.

Afuwape respondeu que, embora seus
ORÍ fossem escolhidos no mesmo lugar, seus destinos é que diferiam."

A questão que aí se apresenta é que somente Afuwape mostrou bom caráter. Respeitando sua crença e realizando seus sacrifícios, ele trouxe as bençãos potenciais de seu destino para a efetiva realização. Seus amigos Oriseku e
ORÍ-Elemere falharam em mostrar bom caráter pela recusa em realizar seus rituais e, por isso, suas vidas sofreram as consequências.

O nome IPIN está igualmente associado à ORUNMILA, conhecido como ELERI-IPIN - o Senhor do Destino e que é aquele que esteve presente no momento da criação, conhecendo todos os
ORÍ, assistindo o compromisso do homem com seu destino, os objetivos de cada um no momento de sua vinda para o AIYE, o programa particular de desenvolvimento de cada ser humano e sua instrumentalização para o cumprimento desse programa.

ORUNMILA
conhece todos os destinos humanos e procura ajudar os homens a trilhar seus verdadeiros caminhos. Temos, assim, que um dos papeis mais importantes de IFA em relação ao homem, além de ser o intérprete da relação entre os ORISA e o homem, é o de ser o intermediário entre cada um e o seu
ORÍ, entre cada homem e os desejos de seu ORÍ. Apenas como registro, é preciso entender que esse mesmo papel ORUNMILA tem na relação com os demais ORISA, sendo o intermediário entre cada um e o seu ORÍ. E ORUNMILA, Ele mesmo, consulta IFA!

Nos momentos de crise, a consulta ao oráculo de IFA permite acesso a instruções a respeito dos procedimentos desejáveis, sendo considerados bons procedimentos os que não entram em desacordo com os propósitos do
ORÍ.
O ser que cumpre integralmente seu IPIN-ORÍ (destino do ORÍ), amadurece para a morte e, recebendo os ritos fúnebres adequados, alcança a condição de ancestral ao passar do AIYE para o ORUN.

Há a crença na existência de duas áreas ocupadas por espíritos dos mortos: ORUN RERE - o bom "céu", habitado pelas divindades e ancestrais, e ORUN APAADI - o "céu" de muitas infelicidades, habitado pelos infelizes que sofreram má sorte e pelos maus, julgados pelo Ser Supremo, segundo o ser caráter. Estes últimos ficam condenados à solidão e ao esquecimento, sem direito a lembrança ou a aparecerem em sonhos e visões - morrem totalmente.

ORUN RERE, por outro lado, é prazeiroso e sereno, vivendo os espíritos numa comunidade composta de parentes e amigos. Podem também permanecer junto aos familiares e intervir em suas atividades diárias, sendo-lhes permitido reencarnar em alguma criança nascida no âmbito familiar.

A respeito do
ORÍ, resta ainda lembrar que trata-se de uma divindade pessoal, a mais interessada de todas no bem estar de seu devoto. Se o ORÍ de um homem não simpatiza com sua causa, aquilo que ele deseja não pode ser concedido nem por OLODUNMARE, nem pelos ORISA.

Da mesma forma se o caráter de um indivíduo é mau, sua escolha de destino pode não se realizar. Se nossa situação é realmente de um mau destino, e não é uma consequência de nosso caráter ou comportamento, então nosso
ORÍ-APERE precisa ser apaziguado.

Oferendas prescritas ou rituais devem ser realizados para nos trazer de volta a um alinhamento saudável.

Considera-se vital para todo homem recorrer a IFA, sistema divinatório de consulta a ORUNMILA, a intervalos regulares para tomar conhecimento do que agrada ou desagrada o próprio
ORÍ. Enquanto intermediário entre a pessoa e as divindades ( entre as quais o próprio ORÍ )

IFA não apenas informa sobre os desejos divinos mas também conduz os sacrifícios ofertados às divindades para que estas possam cumprir seu papel: ajudar os
ORÍ a conduzirem as pessoas à realização do próprio destino.

Se as coisas estão indo mal em sua vida, antes de apontar um dedo acusador para as bruxas, para feitiços ou para seus inimigos, examine sua natureza.

Se Você tem por hábito maltratar as pessoas ou não considerar seus sentimentos, não procure qualquer felicidade ou sorte em sua vida, não importando o quanto Você possa ser bem sucedido materialmente.

Se, por outro lado, Você ajuda os outros e dá felicidade a eles, sua vida será cheia, não só de riquezas mas também de alegria e felicidade. No entanto, lembre-se, é decididamente muito mais fácil alterar seus destino do que sua natureza.

"Por toda parte onde
ORÍ seja próspero, deixe-me estar incluído,
Por toda parte onde
ORÍ seja fértil, deixe-me estar incluído,
Por toda parte onde
ORÍ tenha todas as coisas boas da vida, deixe-me estar incluído.
ORÍ, coloque-me em boa situação na vida,
Que meus pés me conduzam para onde as coisas me sejam favoráveis.
Para onde IFA está me levando eu nunca sei
Jogaram para Assore no início de sua vida.
Se há qualquer condição melhor do que aquela em que estou no presente,
Que possa meu
ORÍ não falhar em colocar-me nela.
Meu
ORÍ me ajude!
Meu
ORÍ, faça-me próspero!
ORÍ é o protetor do homem antes das divindades."

BORI [4]

BORI é o ritual de "dar comida" ou alimentar o ORI (bo
ORI). Deve ser sempre precedido de um jogo que defina sua necessidade e, ao mesmo tempo, oriente o sacerdote sobre os procedimentos particulares para o caso, os ingredientes a serem utilizados naquela situação e o encaminhamento adequado a ser dado para aquela necessidade.

Assim, pode-se realizar um BORI apenas com um ou dois obi e água ou com todo um conjunto de alimentos e a louvação de objetos-símbolos especialmente sacralizados para a ocasião.
É importante entender que sempre que se louva algum tipo de alimento no ORÍ de alguém está se procedendo a alimentação daquele ORÍ.

O BORI pode se apresentar como necessário para alguém em função de algumas situações.

Entre elas:

· como processo de religação do
ORÍ com o seu duplo no ORUN,

· como resposta à condições de "stress" ou fragilização das estruturas psicológicas
do indivíduo resultantes de situações particulares de vida,

· como ritual propiciatório ou complementar a um ebo,

· como ritual propiciatório a processos iniciáticos,

· como resposta a uma necessidade espiritual resultante de feitiço ou destino,

· como indicação de algum Odu (IFA), a partir da interpretação das condições ligadas ao personagem mítico que se apresenta em um dos Itan correspondentes ao Odu.

Pode-se, no geral das situações, estabelecer um ritual básico a ser seguido, não significando isso que o sacerdote deva entender esse ritual básico como limitador da sua ação ou fórmula a ser seguida em todos os casos e situações.

É importante lembrar sempre que o uso e a combinação dos elementos a serem utilizados deve levar em conta as propriedades excitantes (gun) ou calmantes (ero) de cada elemento que está sendo manipulado.


[1]A palavra è significa vida, espírito. A palavra exata para "sopro, respiração", é èémí. Estas duas palavras tem sido objeto, em diversos trabalhos, de confusão ortográfica e conceitual. (Nota de Luiz L. Marins). Ver “A Imortalidade Ioruba” em : http://luizmarins.wordpress.com/afro

[2]Ver “A imortalidade ioruba” em: http://luizmarins.wordpress.com/afro

[3]Segundo Abimbola (1971), o ORÍ escolhido na casa de Ajala pelo ara-òrun antes de nascer, é uma metáfora para “destino” e não deve ser confundido com o ORÍ físico/espiritual criado por Obàtálá. Este ori-destino é colocado sobre o ori físico/espiritual quando o ara-òrun vem para o ayé. [Nota de Luiz L. Marins]. Ver “A imortalidade ioruba” em http://luizmarins.wordpress.com/afro

[4]É importante lembrar que no rito do bori não deve contar nada que seja de Orixa, e qualquer ritual ou objeto que lembre Orixá ou esteja ligado a Orixá não faz parte do bori. Caso contrário, não é um bori. [Nota de Luiz L. Marins]



domingo, 12 de dezembro de 2010

PROFESSOR NORTON CORREA COMENTA SOBRE A “OCUPAÇÃO” NO BATUQUE


Por Erick Wolff

Reza os preceitos e fundamentos do Batuque Afrosul, que todo iniciado no fundamento jamais deverá saber da manifestação do seu Òrìsà durante os rituais, talvez este Tabu fosse criado no inicio da origem destas famílias religiosas, que para preservar os 
lẹ́gùn dos rituais secretos a que são deparados às divindades por eles cultuadas, alguns destes rituais chamados de provas eram temidos até mesmo pelos iniciados mais velhos que não entravam em transe. Contudo mesmo assim é proibido de comentar ou perguntar qualquer coisa que possa levar o lẹ́gùn a desconfiar que houvesse algum relacionamento com o transe.

No livro “Dos Yoruba ao candomblé de  Ketu”, lançado recentemente pela Edusp, por Aulo Barret Filho (Org.), na página 275, no capitulo: "Segredos dos escrever e o escrever dos segredos”, Vagner Gonçalves da Silva, registrou a fala do professor gaúcho Norton Corrêa, que fala da ocupação. Relata Vagner:


Vagner:  Mas se você publica a foto[no livro], a pessoa vai se”ver no santo” [em transe].
Fala Norton Corrêa: Mas isso eu não publico.
Muitas vezes passei estes Slides [...] Eu fazia as fotos da casa e depois eu chegava lá na outra festa: “Olha, eu vou passar as fotos, os slides, só que tem um detalhe: só podem assistir os Orixás”. Ai baixava um monte de orixás que [normalmente] não baixavam, mas nesse dia baixavam. Era uma farra enorme. Eu passava no fim da festa. E eles mesmos evitavam entrar  na  sala onde eu passava isso. Quando  eu passava na universidade ou qualquer coisa assim, eu olhava atentamente na sala para ver se tinha pessoas ali que eu sabia que não poderia ver. ”




Tal comportamento e tabu foi estudado por Norton Corrêa, que produziu riquíssimo material, porem a seguinte frase “ [...] aí baixava um monte de orixás que [normalmente] não baixavam, mas nesse dia baixavam. Era uma farra enorme [...]” ridiculariza e desmerece o batuque.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O perigo da influencia africana e da cultura Afro-brasileira na Umbanda.

A Umbanda solicita atenção e ao mesmo tempo em que sente a necessidade de serem reconhecidos perante a comunidade religiosa afro-descendente brasileira, desde o início da sua fundação, seus rituais sofrem constantemente uma violação cultural e ritualística, contaminando a sua origem e estrutura religiosa pelo sincretismo africano e católico.

Foi lendo alguns livros antigos, que eu notei um deles, em que o sacerdote Matta e Silva, tentou fazer, ao equiparar os caboclos e entidades aos Òrìsà do povo do candomblé, no livro “Umbanda De Todos Nós”, revigorando uma religião que surgia com espíritos que de certa forma foram expulsos do espiritismo, criando assim uma desqualificação destas entidades, que para a época eram considerados sem evolução e sem graduação para pertencerem ao espiritismo  que os repudiava. A existência de orixás na Umbanda seria primordial, afinal se o candomblé possuía seus Deuses e Òrìsà, porque a Umbanda seria diferente?


(Mapa das sete linhas dos Orixás da Umbanda)

(Mapa das sete linhas dos Orixás da Umbanda)


Surgindo assim a linha dos “Orixás caboclos de Oxosse, Orixás caboclos de Xango” e assim vai classificando cada uma das sete linhas da Umbanda elevando cada uma delas a classificação de Orixá da própria Umbanda.

Tal sincretismo foi mais uma vez criticado pelos sacerdotes e adeptos da umbanda kardecista ou espiritismo de terreiro, que tentavam definir o espaço para aqueles espíritos que não possuíam intelecto ou evolução para presidir as sessões espíritas, que não definiria nada menos do que um gesto arrogante separatista, que mais tarde se transformaria numa nova vertente religiosa com entidades carregando características primitivas e uma linguagem muito simples de se dirigir ao povo que ali procurava conforto, popularizando a nova Umbanda que surgia a trazendo fama e destaque na época.

Socialmente a Umbanda sofria preconceito vindo da sociedade, política e religiosos que menosprezavam a nova religião que surgia. O próprio segmento religioso que deu a origem à Umbanda, o espiritismo, não via com bons olhos as entidades e costumes que iniciavam os seus rituais e preceitos. Sem falar no próprio candomblé que subjugava a Umbanda, por confrontar seus conceitos e rituais que mexiam constantemente com os Oku (espíritos).

Eu tenho certeza que o sincretismo foi a base da sua estrutura, para agradar tanto os católicos e os espíritas, havendo uma super valorização dos santos católicos nos Congas (altares) e templos. Na tentativa de promover uma simpatia vinculando assim a Umbanda com os anjos e santos, uma forma simples de usar uma religião mais conhecida e respeitada à frente da própria religião que nascia. Na intenção de ser aceita na sociedade da época e usufruir dos resultados que ela poderia trazer, compartilhando do mito em que os adeptos escondiam fundamentos religiosos atrás das imagens católicas.

Mas onde surgem os problemas?

Como toda religião que se estrutura, o caminho é árduo e chega a sofrer uma metamorfose durante a sua jornada, e claro que mais uma vez usaram a força de uma religião mais famosa e forte na tentativa de estabelecer respeito e fama para aquela que nascia. Mesclando assim dicionários africanos aos rituais, cargos e funções, claro que muitas delas nem deveriam existir dentro da Umbanda, simplesmente porque não possui vínculo ou fundamento para tal.

Alguns exemplos podemos observar nos rituais adquiridos em meados dos "anos 80", que surgiam nas mãos dos sacerdotes desta época. Eu tive oportunidade de conhecer pessoalmente o Templo Guaracy, que temperou seus rituais com os conceitos da liturgia Bantu[1], mesclada com as divindades Yorùbá[2], uma pequena mistura que deu certo na época, onde a internet ainda não era a vilã dos grandes templos. Hoje em dia com a interação dos meios virtuais, ficou mais difícil de conseguir manter por muito tempo a falta de informação e equívocos. Mas não ache que eu estou criticando o ritual do templo, afinal o sacerdote responsável pelo Templo Guaracy fez muito pela Umbanda, estruturando e reorganizando a sua liturgia, o que para a própria era muito confusa antigamente, dando origem a nova Umbanda, readaptada para a sociedade contemporânea.

Os danos desta aculturação vieram a longo prazo, onde tivemos o resultado dos iniciados deste templo que partiram para abrir sua casa sem grandes conhecimentos do conceito que estava surgindo. E aqueles Orixás que antigamente eram os representantes das sete linhas de caboclos foram substituídos pelos Òrìsà cultuados entre o povo Yorùbá. Mas antes que possam reinterpretar o que acabo de relatar é preciso entender que os mesmos Òrìsà cultuados pelo Templo Guaracy, ainda sim eram espíritos, que assumiam os mesmo nomes e identidade originários da Umbanda, (sincretisando) só que sob a influência muito maior da cultura afro-brasileira.

Com um ritual sem o Ejé (sangue) e o sacrifício de animais, ela foi crescendo, com os assentamentos muito semelhantes ao do Candomblé, só que consagrados apenas com cânticos, Amacis (banhos de ervas) e sementes sagradas. Em alguns rituais até a Lobassa (cebola) era usado, porem não era cortada conforme a tradição afro-brasileira, quiçá por não terem passados pelos rituais africanos o sacerdote deste templo cortava em duas e oferecia as “Entidades e Orixás” ali cultuados, mais exemplos de vestígios da aculturação religiosa.

Entre os rituais, logo se estabeleceram os cargos para os adeptos do templo e foi alastrando entre as demais escolas Umbandistas dando o start para a africanização da Umbanda. Surgindo assim uma feroz corrida para quem trouxesse mais itens e fundamentos afro-culturais para os rituais, contaminando e distorcendo a filosofia inicial da Umbanda.

Surgindo casos como a Oxum que antigamente era conhecida pela cor azul marinho, que representava as águas profundas dos rios dotadas dos valores doces, movimentos meigos e fertilidade, para se transformar no dourado do candomblé, revigorado da beleza, vaidade, luxo e desejos, um caminho na contramão do passado simples e dedicado da Umbanda inicial. Em alguns casos vemos os Orixás da Umbanda perdendo até a vestimenta e os apetrechos tradicionais da sua vertente religiosa para se vestir como no candomblé, sem conhecimento algum da cultura e paramentos que cada divindade carrega, transformando o Orixá da Umbanda num fantoche desarticulado e sem graça.

(Oxum da cultura Yorùbá)


(Oxum original da Umbanda)


Lembrando das escolas que começaram a reinventar Orixás, alguns universais outros cósmicos, com a finalidade de vender mais livros e conseguir o primeiro lugar no Pódio cultural Umbandista, abrindo uma disputa nacional para quem inventasse mais fundamentos misturando conceitos com tradição e ciência, criando uma confusão cultural e sócio-religiosa.

Algumas escolas começaram a introduzir os “Búzios” nos rituais, mas porque a necessidade dos búzios dentro da Umbanda? Mas por quê? Se a mesma não precisa e nem nunca precisará usar dos mesmos para seus rituais, simplesmente porque as entidades se comunicam aberta e claramente com o consulente e iniciados da Umbanda, sem necessidade de consulta pelos sacerdotes (isas). Os búzios só são necessários nos rituais Afro-brasileiros, porque as “Divindades” não dão passe, não usam da fala para a comunicação direta, salvo em raros casos onde uma divindade pode pedir ou solicitar algo, mas nem uma delas fica horas conversando ou dando passe nos iniciados do Candomblé.

Então porque fazer o uso dos Búzios numa religião que o contato com o espiritual é direto? O pior é quando vemos uma entidade jogando búzios, esta chega a ser a decadência da evolução da própria religião que conta com a confiança e relação da entidade com o mundo dos vivos, para que traga mensagens e até mesmo alertas para os seguidores daquela religião. Então por que uma entidade necessitaria de um jogo de búzios para ver e falar, seria o fim da espiritualidade e da própria estrutura religiosa.

Mas seria impossível relatar tantos casos e problemas religiosos sem dar exemplos, então vamos lá.

A Umbanda produziu um vocabulário próprio, misturando línguas como Tupi-guarani, Kassange, Fon, Yorùbá, o resultado para muitas casas foi um verdadeiro desastre que chega a doer quando vemos. Palavras como Babá que significa pai é usado para as sacerdotisas e Babalao que significa pai do segredo, é usado para os sacerdotes, contudo, o Babalawo é um cargo apenas para os sacerdotes de Ifá, onde nem mesmo os sacerdotes do Candomblé usam, então o que faz na Umbanda? Justamente chegou a hora de entender o porquê do choque cultural e a desvalorização da mesma, se os cargos como estes que são respeitados por todas as vertentes religiosas são usados sem cerimônia alguma nos templos Umbandistas, então como pode haver reconhecimento da mesma perante a comunidade afro-brasileira?

Seria tão mais harmonioso se usassem o titulo de Babalorixá (pai de orixá) e Iyalorixá (mãe de orixá), para seus rituais, seria tão mais confiante ver o Yorùbá devidamente empregado, respeitando assim a origem e a hierarquia da cultura Africana. Mas para quem pensa que o problema está apenas na Umbanda, se engana, há pouco tempo foi lançada uma obra – "Dos Yoruba ao candomblé de Ketu" – onde um dos colaboradores da coletânea registrou o seguinte – [ Ìyá monde ou Bàbá – mulher que cultua espíritos dos reis mortos. Chamam-na também de Bàbá. O Alafim dirige-se a ela como “pai”, pois elas detêm a autoridade do “pai”, como as dirigentes da Umbanda brasileira, também chamadas de Babá] – pág 149. Reginaldo Prandi

Observem que o Roberval, incentiva o uso e ainda confunde conceitos e cargos ao qual não tem como ser absorvido na cultura da Umbanda, sem falar que ele cita a “Umbanda brasileira”, sem dizer quais mais Umbandas existente, será que a Umbanda nasceu no Brasil ou veio de outro lugar sem ser anunciada?

São erros como estes criados por escritores que geram conflitos entre os membros das religiões afro-brasileiras sedentos por falta conhecimento, um caos acadêmico impresso para qualquer um ler a qualquer momento.

Há algum tempo eu postei uma matéria falando sobre o Politeísmo na cultura afro-brasileira, afinal a sua estrutura não condiz com a existência de um único Deus criador de tudo, oportunamente posso observar que a Umbanda é uma religião monoteísta, afinal ela acredita num Deus que ainda não foi definido se é Olorun ou NZambi ou Oxalá, alguns adeptos chegam a confundir o criador com Jesus, claro é o resultado claro dos danos causados pelo sincretismo na cultura Umbandista. Mas uma coisa é certa o monoteísmo é a estrutura desta religião tão clara como podemos ver que as entidades necessitam pedir permissão nos seus trabalhos a uma divindade maior, para que possam atuar. Outras nem chegam a trabalhar, apenas orientam e se exumam de qualquer responsabilidade, deixando a cargo das forças divinas escolherem o resultado final.

E por fim, chego ao resultado desta confusão expressa na mídia, que ainda não projetou nem uma novela, seriado ou filme com um retrato respeitado da Umbanda, que geralmente é representada numa caricatura deformada e mal divulgada, diferente do Candomblé e o espiritismo que já vimos grandes obras produzidas pelas grandes emissoras e Cia. de cinema. Eu acredito que seria preciso uma reciclagem nos conceitos, comportamento e rituais da Umbanda para que pudesse limar aqueles pequenos equívocos que retiram a credibilidade e confiabilidade da mesma.

Por Erick Wolff8

[1] - Cultura Bantu = Camarinha, muzenza, feitura,
Bori (nome dado para uma obrigação de Caboclo que não tem nada haver com o conceito do Bọrí).
[2] - Divindades Yorùbá = Òòṣàálá, Ṣàngó, Ọ̀sányìn e etc.

Òòṣàálá

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