terça-feira, 15 de agosto de 2017

O CULTO AOS MORTOS NO BATUQUE NÃO É (E NÃO PRECISA SER) UM CULTO DE EGÚNGÚN.

Erick Wolff de Oxalá
Agosto de 2017

Atualizado em:
Setembro de 2024


“De modo algum o ilé-ibo-akú (ibokú)*, a casa do culto aos mortos do lésè òrìsà (casa de orixá), deve ser confundida com o lèsànyìn, a casa do culto de egúngún dos lésè egúngún (terreiro de eégún).
No ibokú são cultuados os espíritos dos iniciados, sacerdotes (tisas) iniciados no culto dos òrìsà.
No lésànyin são cultuados os ará-òrun em geral, e os espíritos daqueles que foram iniciados no mistério dos egúngún.

Òtò ni Eégun, òtò ni Òrìsà

Esta frase, repetida pelos Baba-Eégún em várias ocasiões, significa que os Eégún são totalmente diferentes dos Òrìsà."



Juana Elbein dos Santos & Deoscóredes M. dos Santos,
“O Culto dos Ancestrais da Bahia, o culto dos eégún”,
Tradução de Carlos Eugênio Marcondes de Moura

In: Olóòrìsà, escritos sobre a religião dos orixás,
 (Org.) Carlos Eugênio Marcondes de Moura,
Ed. Ágora, 1981, p. 171.


No texto de chamada deste pequeno artigo, Juana Elbein e seu esposo, Mestre Didi, esclarecem que existe uma diferença entre o ibo, local de culto aos mortos da tradição do terreiro de orixá, e o lèsànyìn, local de culto de baba egun.

Em ioruba, osso se escreve egungun, e o espírito cultuado através deste osso chama-se egúngún (nome).

O culto de baba eégún no ilèsànyin, do terreiro de egúngún nada tem a ver com o culto dos ancestrais religiosos no balé (ibóku) de uma casa de orixá. O que se faz no balé (ibóku) do Batuque não tem nada a ver com o que se faz no lèsànyìn do culto de baba egun.

Queremos destacar esta frase na imagem recortada:

"..os Eégún são totalmente diferentes dos Òrìsà.."

No Batuque do RS, no balé (ibo) se cultua os espíritos dos mortos, babalorixás e ialorixás fundadores (as) das tradições do batuque, e ancestrais das famílias religiosas, mas não existe no Batuque o osso deste ancestral ali presente, naquele chão.

Tem-se notícia que alguns sacerdotes (?) tem o costume de pegar ossos em cemitérios para montar um balé, mas isto, além de estar completamente errado, ainda é crime previsto em lei. Tal prática nada tem a ver com o culto tradicional do ancestral no Batuque e deve ser completamente abolida.

No Batuque, o culto é feito à memória dos nossos ancestrais religiosos, mas os ossos destes ancestrais não estão enterrados ali, por isso, não precisamos de ojé, por que não estamos fazendo culto de baba egun. O local de adoração aos mortos, no batuque, pode ser feito num buraco no mato, ou caso tenha espaço, no pátio do templo; podem destinar um pequeno local para adoração, que o Batuque chama de balé (ibokú), local de culto aos mortos.

Quando cultuamos a memória do morto, nossos ancestrais, criamos um elo entre a comunidade e os mortos através do balé (iboku); desta forma, os descendentes que possuem casa aberta e todos os axés, podem ter um balé (ibóku) em seus templos tão logo seja possível, para que os ancestrais possam abençoar, proteger e orientar aquela comunidade.

Todos os lados do batuque (Jeje, Ijesa, Kambina e Oyo) possuem rituais e fundamentos de egun, no entanto, Kambina é a que mais e destaca pela sua peculiar familiaridade com Xangô Kamuka e os rituais dos mortos da comunidade.

Assim, os rituais fúnebres do Batuque do RS são ministrados pelos babalorixas e iyalorixas, prontos de todos os axés, e inclusive, possuem fundamentos e segredos dos rituais fúnebres, para atuarem dentro do balé (ibóku) da casa de orixá. Não é necessário a presença de um ojé, pois este rito fúnebre do Batuque nada tem a ver com o que se pratica no lèsànyìn (léssanin) do culto de baba egun, pois nos terreiros de Orixá, como o culto é para memória dos mortos, não precisa do osso; bastam-se os paramentos ou utensílios que o representem. Por isso, repetimos, ojé é desnecessário. Um sacerdote que faleceu, não se torna Baba Egun simplesmente pelo fato do seu cargo de Baba, sendo um equivoco afirmar que o  Baba falecido no Batuque é um Baba Egun.

O nome do ritual fúnebre do batuque chama-se orissun ou, arissun ou, sirrum. Assim que o individuo falece, iniciam os rituais com corpo presente. Prepara-se a pessoa, o caixão, fazem rituais sobre ele, inclusive dançam em volta e depois levam este caixão embalando ao som de cantigas fúnebres. Após isso, os rituais levam sete dias, no ultimo despacha todo o carrego, e guarda o luto que poderá chegar a um ano.

Aos sacerdotes que possuem balé (ibóku), anualmente costumam fazer uma festa para os mortos, com muita comida e rituais. Antigamente os mais velhos chamavam de missa de Egun. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como informamos acima, o culto aos ancestrais iniciadores do Batuque do RS são de exclusividade dos sacerdotes de orixá, e o culto da memória do falecido não necessita do osso, e não faz nenhum sentido pegar ossos em cemitérios de cadáveres desconhecidos, para cultuar como ancestral.

Assim os sacerdotes do Batuque que sabem como praticar seus rituais aos mortos desta comunidade, não necessitam de um ojé, sacerdote de outra religião, que é o culto de baba egun, e nem cometerem o crime de buscarem ossos em cemitérios.

Para finalizar, tenham em mente que cultuar um ancestral religioso no balé (ibóku) de uma casa de orixá, não tem nenhuma relação com o culto de baba egun no terreiro de egúngún. Misturar os dois cultos é se perder pelo caminho. 

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* Diferente do que a autora informa "ilé-ibo-akú (ibokú)", os mortos em Ioruba é Òkú, por motivos de não podermos modificar a referencia, foi mantido o texto.

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