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31/03/2020
A dinâmica mitológica da tradição oral é sempre contemporânea e atualizada com os acontecimentos que afetam uma sociedade ágrafa, algo que a modernidade gráfica não poderá retirar-lhe jamais. Por mais que a mitologia da tradição oral venha ser impressa, jamais poderá ser engessada pela modernidade das obras impressas.
Sobre isso, Roberval Marinho[1] (2010, p. 161) diz que:
“O sistema dinâmico de criação de mitos filosóficos, explicativos e contextuais, relacionados a um fato ou evento ocorrido em determinada época em uma cultura ágrafa [...] através da reimaginação mitológica forma a dinâmica do movimento, adaptação e alegria do mito em suas variantes locais e, sem os rigores da academia, formam a oralidade básica e religiosa...”
Neste mês de março de 2020, em plena pandemia do Corona vírus, o Otuagasa Ifá Temple da família Elebuibon, de Oxobô, Nigéria, publicou sua contribuição através de seu grupo no WhatsApp, apoio à humanidade realizando um jogo para o Corona vírus, como poderemos ver nas imagens no fim do texto.
Corroborando a fala acima, do professor Roberval Marinho, foi criado pelos babalaôs da família Elebuibon, de Oxobô, um novo e importante mito para registrar no odu (signo) Ose’bara, para ajudar a humanidade neste momento difícil. Interessa-nos destacar alguns pontos:
· Ifá diz que esta doença veio do mundo espiritual porque a humanidade se afastou de Deus.
· Ifá diz que esta doença veio para a terra por causa de uma guerra entre dois países.
· Ifá diz que somente forças poderosas poderão vencer esta doença.
· Ifá diz que se não houver cooperação entre os povos, outras doenças virão novamente.
· Ifá confirma o Corona vírus como uma doença respiratória e infecciosa, e que devemos observar as recomendações médicas de higiene.
· Ifá diz que os líderes devem ter responsabilidade pois serão responsabilizados por suas ações e omissões.
· Ifá diz que as pessoas que estão trabalhando para a solução serão recompensadas pelos deuses, mas que alguns aproveitarão a oportunidade para ganhar dinheiro.
· Ifá diz que os políticos não devem usar a doença como um jogo político e econômico.
· Ifá confirma que o Corona vírus atingirá mais os idosos.
· Ifá diz que em todo o mundo os líderes serão afetados, mas que alguns nomes não serão divulgados.
· Ifá diz que as nações entrarão em recessão, e que nós devemos evitar o desperdício.
· Ifá diz que devemos colocar óleo de palma na frente de nossas casas para apaziguar os poderes místicos associados com a pandemia.
· Ifá diz que precisamos pedir ajuda aos nossos ancestrais, especialmente egunguns Babalago, com cinco nozes de cola, representando cada um dos cinco continentes.
· Ifá diz que cada cidade deve fazer seu próprio ritual expiatório.
A mensagem finaliza dizendo que o ebó prescrito por Ifá foi realizado e que devemos divulgar estas informações.
Considerações finais
Julgamos importante registrar esta comunicação do Otuagasa Ifá Temple, da família Elebuibon, de Oxobô, por dois motivos:
· O primeiro, logicamente, pela contribuição dos babalaôs desta família para a humanidade em um momento tão difícil para todos.
· O segundo, mostrar que a dinâmica da tradição oral jamais poderá ser substituída por livros engessados tal como os livros sagrados de outras religiões que ficam fossilizados no tempo. A criação de um novo mito sobre o Corona vírus foi excelente para mostrar que os oráculos iorubas não são engessados, ao contrário, são dinâmicos e atualizados com o seu tempo, de forma que a mitologia oracular será sempre recriada de acordo com a evolução e acontecimentos sociais, políticos e humanitários contemporâneos, tal como já dizia o professor Roberval Marinho.
[1]
Professor e pesquisador da Universidade Católica de Brasília. Ogã do Ilê Axé
Opô Afonjá. Presidente nacional do Alaindê Xirê.
REFERENCIA:
MARINHO, Roberval. "O Imaginário Mitológico na Religião dos Orixás" em: BARRETTI FILHO, Aulo. Dos Yoruba ao Candomblé Ketu, Edusp, São Paulo, p. 161
REFERENCIA:
MARINHO, Roberval. "O Imaginário Mitológico na Religião dos Orixás" em: BARRETTI FILHO, Aulo. Dos Yoruba ao Candomblé Ketu, Edusp, São Paulo, p. 161