sábado, 14 de janeiro de 2023

PROJETO DE LEI RECONHECE OS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS DE MATRIZ AFRICANA

Já alguns tempo venho lendo leis que pouco contribuem para nossa sociedade afro religiosa, no entanto, o Projeto de lei CM 213/2022 me surpreendeu, por isso segue o merecido compartilhado neste blog:



Enviado por Matamoride Ijoba Angola em 14/01/2023



PROJETO DE LEI CM 213/2022 Reconhece os povos e comunidades tradicionais de Matriz Africana presentes nesse município e torna suas prática e saberes ancestrais integrantes do patrimônio cultural de natureza imaterial do município de Santo André.
AUTOR: Vereador Ricardo Alvarez (PSOL)

 

"A CÂMARA MUNICIPAL DE SANTO ANDRÉ APROVA:
Art. 1º Ficam reconhecidos os Povos Tradicionais de Matriz Africana (POTMA), as Comunidades Tradicionais formadas por estes Povos, historicamente presentes nesse Município, bem como a importância do povo negro em geral no processo de construção, física e cultural, desta cidade, desde a sua constituição até os dias atuais, e declaradas como Patrimônio Cultural, de Natureza Imaterial, da Cidade de Santo André as suas práticas e seus saberes ancestrais.

 

§1º Para fins desta Lei, entende-se por Povos Tradicionais de Matriz Africana:
I - Os grupos que se organizam a partir de valores civilizatórios e da cosmovisão trazidos para o país por africanos para cá transladados durante o sistema escravista, o que possibilitou um contínuo civilizatório africano no Brasil, constituindo territórios próprios caracterizados pela vivência comunitária, pelo acolhimento e pela prestação de serviços à comunidade; concomitantemente,
II - Os grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição; e
III - Os grupos que mantém a convivência em comunidade e o acolhimento, independente do grau de parentesco sanguíneo ou da ausência deste parentesco e que a classe social dos indivíduos não é levada em consideração, pois no momento em que estão inseridos nesta comunidade, por meio do processo ritualístico iniciático, passam a fazer parte de uma família tradicional de matriz africana, em que a hierarquia, o respeito ao mais velho e o compromisso com o mais novo, são fatores fundamentais para a preservação da tradição e costumes ali conservados, historicamente praticados e repassados por meio da oralidade.

 

§2º - Os Povos Tradicionais de Matriz Africana não se constituem em uma unidade homogênea, mas em uma diversidade integradora.

 

§3º Para fins desta Lei, entende-se por:
I - Comunidades Tradicionais de Matriz Africana:
a) Unidades territoriais, Territórios ou Casas Tradicionais / Terreiros / Roças / Barracões - constituídos pelos africanos e/ou sua descendência no Brasil, no processo de insurgência e resistência ao escravismo e ao racismo, a partir da cosmovisão e ancestralidade africanas, e da relação desta com as populações locais e com o meio ambiente, representando o contínuo civilizatório africano no Brasil, constituindo territórios próprios caracterizados pela vivência comunitária, pelo acolhimento e pela prestação de serviços na comunidade, são espaços de alta complexidade, por serem onde se ritualizam origem e destino e onde tomam forma a cultura, as representações e os valores ancestrais ; concomitantemente,
b) Espaços de busca do sentido de pertencimento dos POTMAS, embora com diferentes denominações a depender da região do país e do povo que a constitui, prevalece em todos esses territórios tradicionais de matriz africana, "um conjunto organizado de representações litúrgicas" que tornam esses espaços/comunidades "territórios político/mítico", lugares de resistência, transmissão de conhecimentos e preservação de identidades, sendo reconhecidos, ao longo das décadas, como lugares privilegiados de manutenção, construção e reconstrução tanto da tradição quanto de sua cosmovisão, considerando que, no caso dos Povos Tradicionais de Matriz Africana, o vínculo entre essas duas esferas intrínseco e indissolúvel.
II - Autoridades Tradicionais de Matriz Africana: os mais velhos da comunidade tradicional, investidos da autoridade que a ancestralidade lhes confere.
III - Lideranças Tradicionais de Matriz Africana: as demais lideranças constituídas dentro da hierarquia própria dos territórios e das casas tradicionais.
Art. 2º O reconhecimento previsto no art. 1º desta Lei visa estimular à discussão sobre a criação e implementação de um Inventário das Referências Culturais de Matriz Africana da Cidade de Santo André, com vistas a mapear, catalogar, identificar e registrar, através de estudos técnicos e científicos, as práticas e saberes preservados pelos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africanas no Município, em suas diferentes vertentes:
I - Formas de Expressão;
II - Ofícios e Modos de Fazer e viver;
III - Celebrações;
IV - Lugares e territórios;
V - Edificações.
Art. 3º Para fins do disposto nesta Lei, o Poder Executivo Municipal procederá aos registros necessários nos livros próprios do órgão competente.
Art. 4º O reconhecimento previsto no art. 1º desta Lei visa igualmente estimular à discussão sobre a criação e implementação de um Plano Municipal de Desenvolvimento Sustentável dos POTMAS no Município de Santo André, que contemplem as seguintes diretrizes:
I - Garantir a estes povos seus territórios, e o acesso aos recursos naturais que tradicionalmente utilizam para sua reprodução física, cultural e econômica;
II - Implantar infraestrutura adequada às realidades socioculturais e demandas dos POTMAS;
III - Garantir os direitos desses afetados direta ou indiretamente por projetos, obras e empreendimentos;
IV - Garantir e valorizar as formas tradicionais de educação e fortalecer processos dialógicos como contribuição ao desenvolvimento próprio de cada povo e comunidade, garantindo a participação e controle social tanto nos processos de formação educativos formais quanto nos não formais;
V - Reconhecer, com celeridade, a autoidentificação dos POTMAS, de modo que possam ter acesso pleno aos seus direitos civis individuais e coletivos;
VI - Garantir o acesso aos serviços de saúde de qualidade e adequados às suas características socioculturais, suas necessidades e demandas, com ênfase nas concepções e práticas da medicina ancestral e tradicional;
VII - criar e implementar, urgentemente, uma política pública de saúde voltada aos POTMAS;
VIII - garantir o acesso às políticas públicas sociais e a participação de representantes dos POTMAS nas instâncias de controle social;
IX - Garantir nos programas e ações de inclusão social recortes diferenciados voltados especificamente para os POTMAS;
X - Implementar e fortalecer programas e ações voltados às relações de gênero nos POTMAS, assegurando a visão e a participação feminina nas ações governamentais, valorizando a importância histórica das mulheres e sua liderança ética e social;
XI - garantir aos POTMAS o acesso e a gestão facilitados aos recursos financeiros provenientes dos diferentes órgãos de governo;
XII - assegurar o pleno exercício dos direitos individuais e coletivos concernentes aos POTMAS, sobretudo nas situações de conflito ou ameaça à sua integridade;
XIII - reconhecer, proteger e promover os direitos dos POTMAS sobre os seus conhecimentos, práticas e usos tradicionais;
XIV - apoiar e garantir o processo de formalização institucional, quando necessário, considerando as formas tradicionais de organização e representação local; e
XV - Apoiar e garantir a inclusão produtiva com a promoção de tecnologias sustentáveis, respeitando o sistema de organização social dos POTMAS, valorizando os recursos naturais locais e práticas, saberes e tecnologias tradicionais.
Art. 5° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação"


Fonte http://www.cmsandre.sp.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=18968:2022-11-29-19-25-54&catid=12:noticias-do-vereador&Itemid=9 

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