Postado em 27/07/2022
Revisado e aumentado em 19/10/2023
REVISTA OLORUN n. 46, janeiro de 2017
ISSN 2358-3320 – www.olorun.com.br
NAÇÕES RELIGIOSAS AFRO-BRASILEIRAS
NÃO SÃO NAÇÕES POLÍTICAS AFRICANAS
Erick Wolff
Março de 2016
SOBRE NAÇÕES
Nos diversos segmentos religiosos afro-brasileiros todos querem legitimar-se afirmando que sua
“nação” é originalmente oriunda de solo africano, desta ou aquela região, iniciado por fulano ou
ciclano cujo nome jamais poderá ser checado, supostamente nascido na África. É louvável o
desejo da legitimização africana, se não fosse ilusório.
Todas as nações religiosas afro-brasileiras, de todos os segmentos, nasceram no Brasil, são afro-brasileiras, não são africanas, não representam nenhum Estado ou Cidade africana, não praticam
nenhum culto na forma tradicional africana mesmo que possuam nomes de cidades africanas em
suas definições afro-sociais. É verdade que foram formadas por elementos de matrizes africanas
aqui repensadas e reestruturadas, mas estas heranças culturais e religiosas não fazem de
nenhuma nação de religião afro-brasileira uma nação pura africana. NENHUMA!
Entretanto, o fato de terem nascido no Brasil não significa que são uma fraude, pois se assim
fosse, todas os segmentos religiosos afro-brasileiros seriam, mas não, todas são legítimas para o
Brasil. O erro está em considerar que a nação do outro é uma fraude, e a sua é verdadeira, porque
é supostamente original de algum lugar da África.
A nação afro-brasileira de kétu refere-se a uma nação afro-religiosa do candomblé, e não à cidade
ioruba africana de Kétu, localizada no Dahome. (José Beniste)
A nação afro-brasileira angola refere-se a uma nação afro-religiosa do candomblé, e não ao país
africano de Angola.
A nação afro-brasileira Jeje refere-se a uma nação afro-religiosa do candomblé, Batuque ou
tambor de mina. Segundo o professor Reginaldo Prandi (USP), não existe nenhuma nação política
denominada “Jeje” em solo africano. O mesmo vale para a nação religiosa afro-brasileira “nagô”.
A nação religiosa afro-brasileira Oió refere-se a uma nação religiosa do Batuque, e não à cidade
Iorubá de Oió, na Nigéria.
A nação religiosa afro-brasileira Kambina, do Batuque, refere-se a uma nação religiosa criada e
estrutura aqui no Brasil, tanto quanto as outras, e não à alguma cidade ou nação na África. Se as
outras aqui formadas são legítimas para o Brasil, a Kambina também é. Alguns sacerdotes tentam
equivocadamente afirmar que a Kambina trata-se de Cabinda, província de Angola, sem apenas
pela semelhança do nome.
Não existe nenhuma nação religiosa afro-brasileira, de qualquer segmento, que seja a extensão
pura e legitima de uma cidade, estado ou nação africana, que exista aqui tal qual existe em África.
Acreditar nisto é utopia, ou má fé. Todas, sem exceção, foram pensadas, criadas e estruturadas
no Brasil.
As nações afro-religiosas da forma como existem aqui não existem na África, e vice-versa. Que
isto fique claro para que não se arvorem prepotentemente sobre falsos conceitos de pureza. Não
existe ninguém puro (Mãe Stella).
Sobre o conceito de nação religiosa afro-brasileira separamos alguns extratos de pessoas
altamente conceituadas e referenciadas na bibliografia afro-brasileira:
SOBRE REIS E PRÍNCIPES
O conceito que um rei de uma nação afro-brasileira precisa ter sangue nobre africano para ser
reconhecido é utópico. Não existe nenhuma prova exata e certa que algum rei, rainha, príncipe
ou princesa africanos que aqui fundaram qualquer nação pura, tal qual em África.
Sempre em algum momento da história das religiões afro-brasileiras surgiram “reis” desta ou
aquela nação religiosa aqui formada que, ou se auto intitularam, ou foram titulados pelos seus
seguidores. Reis não nasceram com o mundo, eles foram feitos reis pelos homens, e para os
homens.
Se as nações religiosas afro-brasileiras não são nações políticas africanas, reis e os príncipes
religiosos afro-brasileiros também não são, nunca foram. Exigir sangue nobre como base para
seu reconhecimento e legitimação não faz sentido, até porque tal, mesmo que verdade fosse,
não se poderia provar.
Afirmar através de documentações discutíveis que um africano puro vindo de uma nação africana
pura, veio ao Brasil há “duzentos” e aqui fundou uma nação pura, é zombar da inteligência dos
estudiosos e explorar o boa fé dos leigos.
O que dá legitimidade a um “rei” religioso afro-brasileiro (ou em qualquer lugar do mundo) é o
reconhecimento de seus súditos e a reverencia a ele prestada, independente de ser auto
intitulado, ou de ter sido titulado após a morte. É importante para uma nação religiosa
afro-brasileira aqui formada conhecer suas origens e ser respeitada através de um ícone.
Mas estas origens estão aqui mesmo no Brasil, todas as nações religiosas afro-brasileiras tem seu
fundador mítico. Estas nações devem respeitar-se mutuamente respeitando seus fundadores. Se
o rei em questão é reconhecido por seus súditos, então ele é rei, independente do sangue de
família e de sua suposta origem africana, ou não. O mesmo conceito vale para os príncipes e
princesas.
Entre os iorubas, o conceito de principado é diferente do europeu, pois não é preciso ter sangue
nobre para ser príncipe. Quando um rei é coroado, todas as crianças que nascem no lugar de
origem do rei, a partir desta data, são considerados príncipes (Nathan Lugo).
Algumas considerações
O Batuque possui identidade, rituais e origens próprias, por isso, é completamente errado, como vemos alguns autores dizendo que o Batuque seria um tipo de Candomblé gaúcho. Não, não é, assim como o Candomblé não é um Batuque nem precisa ser.
O Candomblé possui várias Nações com costumes, idioma, divindades e tradições diferentes.
O Batuque possui segmentos atualmente destacam-se Oyo, Nagô, Kanbina, Jeje e Ijesa que cultuam as mesmas divindades, possuem os mesmos costumes, iniciações e tradições, portanto, podemos dizer, conforme o Conceito de Nação, que o Batuque é uma nação com alguns segmentos.
Concluindo que tanto o Candomblé quanto o Batuque nasceram aqui, não veio da África, sendo que até o momento não temos registros que existiu ou existe Batuque ou Candomblé em qualquer lugar da África.
Sobre o conceito de Reis, Rainhas, Príncipes e Princesas africanas nem sempre se baseiam em sangue real, mas são denominados conforme os ritos ou costumes de uma região.
O mesmo ocorre no Brasil, onde Reis, Rainhas, Príncipes e Princesas recebem suas condecorações pelos seus súditos.